segunda-feira, 24 de agosto de 2009

A religião nas salas de aula


O Ensino Religioso é ministrado aos alunos das oitavas séries das escolas estaduais de São Paulo. A carga horária é pequena, apenas uma aula de 50 minutos por semana. A disciplina é optativa. Religião na escola pode ser perigoso... Li esses tempos uma reportagem sobre o assunto, que trazia um levantamento do ensino de religião no Brasil, e relatava-se ali alguns absurdos, como o caso da professora que convertia os alunos para sua religião, comemorando o fato como “salvação” das crianças. O proselitismo é praxe e muitos estudantes, oriundos de famílias que seguem as religiões afro-brasileiras, se sentem discriminados e diminuídos, ao ponto de esconderem suas crenças para evitar a perseguição. Nesse caso, as aulas de Ensino Religioso acabam acirrando os problemas que deveriam atenuar.
Por se tratar de um ambiente frequentado por pessoas de diversas origens e culturas, as escolas deveriam ser ambientes laicos onde todas as diferenças fossem aceitas e respeitadas.
Na escola onde trabalho, o número de adeptos das religiões protestantes de origem pentecostal é alto, superando a média nacional. Como se trata de uma área rural, tem as mesmas características, para os fins de religião, que as periferias das grandes cidades. A presença dos templos pentecostais é maciça, ainda que sejam acanhados e simples. Percebe-se que, em muitos casos, o momento do culto e as atividades ligadas à religião são as únicas opções de sociabilização e entretenimento.
Para esse público, o importante é relativizar as crenças, deixar claro que existem muitas “verdades” quando se trata da religião. Combater o fundamentalismo é quase obrigatório. Para levantar essas questões, desenvolvi um currículo que aborda a história e as doutrinas das religiões de povos de todo o mundo. Sempre começo com as religiões orientais, mais exóticas para eles. Mais tarde, gasto um tempo longo tratando do islamismo, religião tão cercada de preconceitos.
No segundo semestre, passo a abordar as religiões presentes no Brasil. Costumo começar apresentando uma tabela com os dados colhidos pelo IBGE nos recenseamentos. É uma oportunidade para enxergar a diversidade religiosa do país. Fazemos também uma análise comparativa das estatísticas sobre religião no Brasil ao longo das últimas décadas, atividade que evidencia o crescimento das religiões pentecostais e neopentecostais, bem como do ateísmo, concomitantemente ao declínio do catolicismo.
Nesse semestre, atado à ideia de diminuir as aulas expositivas, retomei os trabalhos no Ensino Religioso propondo aos alunos que realizem uma pesquisa sobre dez das mais expressivas religiões brasileiras, oferecendo a eles alguns itens que devem ser respondidos ao longo do trabalho. Como sempre, reservo um espaço para abordar as religiões afro-brasileiras, que são as mais aviltadas em nosso país. Sinto que mesmo entre os professores, que deveriam reprimir qualquer traço de preconceito, ocorre uma aversão declarada às tradições afro-brasileiras...
Estamos na fase de coleta das informações, e como sempre, não posso contar com o funcionamento completo da sala de informática. Apenas um dos cinco grupos conseguiu acessar um site antes da pane costumeira. C’est la vie...
No início, após realizar a pesquisa que constatou que metade dos alunos vinha de famílias filiadas ao protestantismo, acreditei que iria enfrentar problemas por desenvolver essa abordagem multirreligiosa. Nos quatro anos em que venho ministrando a disciplina nesta escola ainda não tive nenhum atrito... E, ao que parece, as aulas tem contribuído para abrandar preconceitos e desmontar dogmas.

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