GALILEU – É
ANDREA – Não. Por que o senhor quer que eu entenda? É muito difícil, e eu ainda não fiz onze anos, vou fazer em outubro.
GALILEU – Mas eu quero que também você entenda. É para que se entendam essas coisas que eu trabalho e compro livros caros em lugar de pagar o leiteiro.
ANDREA – Mas eu vejo que o Sol de noite não está onde estava de manhã. Quer dizer que ele não está parado! Nunca e jamais.
GALILEU – Você vê! O que é que você vê? Você não vê nada! Você arregala os olhos, e arregalar os olhos não é ver. (Galileu põe a bacia de ferro no centro do quarto.) Bem, imagine que isso é o Sol. Sente-se aí. (André senta-se na única cadeira; Galileu está de pé, atrás dele.) Onde está o sol, à direita ou à esquerda?
ANDREA – À esquerda.
GALILEU – Como fazer para ele passar para a direita?
ANDREA – O senhor carrega a bacia para a direita, claro.
GALILEU – E não tem outro jeito? (Levanta Andréa junto com a cadeira do chão, faz meia volta com ele.) Agora, onde é que o Sol está?
ANDREA – À direita.
GALILEU – E ele se moveu?
ANDREA – Ele, não.
GALILEU – E o que se moveu?
ANDREA – Eu.
GALILEU (berrando) – Errado, seu burro! A cadeira!
ANDREA – Mas eu com ela!
GALILEU – Claro. A cadeira é a Terra. Você está em cima dela.
(A empregada entra para fazer a cama e assiste à cena.)
DONASARTI – Senhor Galieu, o que o senhor está fazendo com o meu menino?
GALILEU – Eu o estou ensinando a ver.”
BRECHT, Bertold (1898-1956). Vida de Galileu (1938-39).
In Teatro Completo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991. p.58-60.
Uma nova visão do homem e do mundo
Profundas transformações ocorreram na Europa entre o final da Idade Média e o início da Idade Moderna, como a intensificação da vida urbana, da economia monetária e comercial, o enriquecimento da burguesia e o fortalecimento do poder dos reis. Esse foi também o período das Grandes Navegações, da criação de novas técnicas de exploração agrícola e mineral, da difusão do uso das armas de fogo, da imprensa, de novos tipos de papel e de tintas, do desenvolvimento da matemática, da geometria, da cartografia, da medicina etc.
Tais mudanças despertaram novas idéias sobre a natureza e o ser humano. Pensadores chamados humanistas acreditavam que o homem, com a educação adequada, seria capaz de dominar seu destino, controlar e transformar a natureza. Essa nova visão de mundo, chamada antropocentrismo, se opunha aos valores medievais, atribuindo ao homem, e não à vontade de Deus, a responsabilidade por suas conquistas e fracassos.
O humanismo tornou-se um movimento literário e filosófico que propunha uma nova educação, baseada na crítica dos textos, no estudo das línguas e das ciências e na observação da natureza. Seus seguidores traduziram e divulgaram os textos da Antiguidade grega e romana.
A paixão e o entusiasmo pelo conhecimento levaram os humanistas a expandirem-se nas mais diversas áreas – línguas, ciência, religião, música, geografia, astronomia, artes etc. – a fim de descobrirem o funcionamento e a razão de ser de todas as coisas.
Eles não se limitaram a estudar os textos antigos e os fenômenos naturais. Procuraram também melhorar a sociedade em que viviam. O inglês Thomas Morus, por exemplo, imaginou em sua obra Utopia (1516), uma sociedade ideal baseada na igualdade e na tolerância. O holandês Erasmo de Rotterdam criticou os costumes sociais e os abusos da Igreja em Elogio da Loucura (1511). O italiano Maquiavel, na sua obra O Príncipe (1513), estudou como se toma, se conserva e se perde o poder. O francês Rabelais, em seus livros Pantagruel (1532) e Gargântua (1534), defendeu a idéia de que os homens deviam se guiar apenas pelas leis da natureza.
Os humanistas, mesmo discordando da Igreja, não eram ateus. Eram cristãos que desejavam reinterpretar as mensagens bíblicas. Muitos foram perseguidos, exilado ou condenados à morte por suas idéias.
Uma arte renovadaO melhor exemplo da renovação cultural dos séculos XV e XVI ocorreu nas artes plásticas. Pintores, escultores e arquitetos romperam com a arte medieval, utilizando novas técnicas e novo estilo. Inspiraram-se nas criações dos antigos gregos e romanos e, por isso, sua arte foi chamada de “renascentista”.
O Renascimento surgiu na Itália, onde ainda restavam muitos monumentos da Antiguidade romana. O comércio mediterrâneo havia feito florescer numerosas cidades-estados, como Florença, Veneza, Roma e Milão, rompendo definitivamente com a tradição feudal. Os governantes e burgueses poderosos dessas cidades disputavam entre si, mandando construir palácios, igrejas e catedrais, erguer estátuas em locais públicos e pintar quadros e afrescos para decorar os edifícios. Contratavam os artistas, pagavam suas despesas e a obra encomendada. Esses burgueses financiadores das artes eram chamados mecenas.
A arte renascentista tem um duplo aspecto: inspira-se no passado e mostra inovações. Os artistas exploraram temas da mitologia e da história antiga e imitaram as formas da arquitetura e da escultura greco-romana. Mas inventaram a perspectiva e aprimoraram o naturalismo, usando novos conhecimentos da matemática, da física, da anatomia, da geometria e de outras ciências.
O artista renascentista tratou a figura humana como a mais bela de toda a criação e procurou fazê-la exprimir força e harmonia. Estudou as proporções e o movimento do corpo, a tensão dos músculos, os traços fisionômicos e os gestos das mãos. Reproduziu cenas do cotidiano e, uma novidade, pintou a si mesmo e assinou seu quadro. Esse é um exemplo do culto ao indivíduo, que também caracterizou o período.
O Renascimento se difundiu por toda a Europa graças ao mecenato dos nobres e burgueses e às viagens dos artistas. Entre os maiores artistas destacaram-se os italianos:
- Leonardo da Vinci (1452-1519): um gênio criativo que, além de pintar (Última ceia, Virgem dos rochedos e Mona Lisa ou Gioconda), estudou anatomia, botânica, ótica, geologia e mecânica, formulando, em cada uma dessas áreas de conhecimento, múltiplos projetos e fecundas hipóteses.
- Michelangelo (1475-1564): célebre por seus afrescos na Capela Sistina (no Vaticano), entre eles A criação do Homem e Juízo Final, e suas esculturas Pietà, Moisés e Davi. Como arquiteto, projetou a gigantesca cúpula da basílica de São Pedro, em Roma.
Uma revolução nas ciênciasAté o século XV, os fenômenos da natureza eram matéria religiosa. A verdade baseava-se na fé e na tradição, isto é, na Bíblia e nos ensinamentos dos mais velhos. Assim, desde as doenças até os movimentos dos astros, tudo estava relacionado com a vontade de Deus. Duvidar da verdade estabelecida pela Igreja ou estimular a curiosidade eram atitudes desrespeitosas e ofensivas. Na Idade Média, acreditava-se que a natureza era um mistério que só a Deus pertencia.
Os renascentistas não aceitaram essa atitude e ousaram questionar as verdades estabelecidas pela Igreja. Curiosos e observadores interessaram-se por tudo o que os rodeava. Usaram a razão para conhecer e explicar os fenômenos naturais. Recusaram-se a aceitar aquilo que não pudessem ser comprovados. Por basearem suas observações em cálculos e experimentos, os renascentistas deram origem à “ciência experimental”.
Copérnico se opôs à idéia de Ptolomeu de que a Terra era o centro do universo, afirmando que ela era apenas mais um planeta girando em volta do Sol. Mas confirmou a trajetória circular dos planetas. Em 1584, o filósofo italiano Giordano Bruno defendeu a idéia de um universo infinito e da existência de outros mundos habitados. Pouco depois, o alemão Kepler descobriu a trajetória elíptica dos planetas. Em 1610, o físico, matemático e astrônomo Galileu Galilei, no primeiro de sues muitos livros, confirmou o sistema heliocêntrico proposto por Copérnico e revelou suas descobertas, feitas por meio de um telescópio que ele próprio aperfeiçoara: as montanhas da Lua, os satélites de Júpiter, as manchas solares, as fases de Vênus e os anéis de Saturno.
Vesálio estudou o corpo humano por meio da observação e dissecação de cadáveres, fundando as bases da moderna anatomia. Na mesma época, o alquimista e médico suíço Paracelso curava doenças usando métodos novos que dariam origem à homeopatia e à quimioterapia. Em 1546, o livro do médico italiano Fracastoro revelava a teoria do contágio e explicava a causa das infecções. Em 1628, o inglês William Harvey publicou a sua descoberta sobre a circulação do sangue.
Leonardo da Vinci, além de artista, foi grande pesquisador, com agudo senso de observação. Projetou inventos espetaculares que, séculos depois, seriam realizados: o pára-quedas, o “parafuso-voador” (futuro helicóptero), o submarino, a máquina a vapor, o balão etc. Pesquisou também o som, as cores e as luzes.
Esse material tem origem em diversos livros didáticos.