domingo, 30 de agosto de 2009

Matéria publicada na Folha de São Paulo de hoje, no caderno Cotidiano.

"Mestres se veem na berlinda diante de novo ambiente escolar "

Como a tecnologia, a violência e as doenças do aprendizado mudam as salas de aulas, trazendo desafios e provocando a discussão sobre o papel do professor
OCIMARA BALMANT
LETÍCIA DE CASTRO
DA REVISTA DA FOLHA

Em uma escola na periferia da zona sul de São Paulo, mais de 2.000 alunos gritam ao mesmo tempo que querem ser dispensados para assistir ao jogo de futebol. Não são atendidos e colocam fogo em carteiras.
No colégio de classe média na zona norte, um aluno de 12 anos diz à professora que é ele quem paga o salário dela e que deve fazer tudo o que ele quer.
Perto do parque Ibirapuera, a professora é avisada pela coordenadora de que um dos seus alunos foi mal na prova, mas não pode ser reprovado porque há um laudo atestando que sofre de déficit de atenção.
Os episódios ilustram alguns dos desafios que os docentes enfrentam nas salas de aula. Há problemas antigos, como a violência, e outros bem atuais, como a concorrência com equipamentos eletrônicos ou as doenças do aprendizado.
Geração on-line
A lousa está repleta depois da aula de português. O adolescente não copia uma sentença: basta pegar o celular e registrar tudo com a câmera. O episódio foi no colégio Santa Maria, zona sul. Não houve broncas."A tecnologia é matéria-prima, objeto de estudo. Não posso dizer que não presta ou proibir", explica Elizabeth Fantauzzi, 47, responsável por disciplinas como web design e fotografia digital.
A praga do laudo
Depois de uma discussão com um aluno, a professora Silvia Barbára, 49, coloca o estudante de 16 anos para fora da sala de aula. Ele sai, mas a xinga de "puta". A coordenadora da escola explica que o mau comportamento se deve a uma troca de medicamentos. A professora vive esbarrando em diagnósticos de déficit de atenção.
Segundo a psicóloga da Unicamp Cecília Collares, que estuda a "patologização da educação", o fenômeno causa reação em cadeia. Os pais reagem como se fosse uma fatalidade, a escola se isenta, e o professor se vê desvalorizado.
Discriminação e violência
B.C., 49, professor da rede estadual há 29 anos ficou uma semana na UTI depois de ter a diabetes descontrolada. O motivo: preconceito. Uma dupla de alunas pediu o afastamento do professor homossexual.
Para a educadora da Unicamp Angela Soligo, casos de agressão física e de depredação são decorrentes do processo de sucateamento a que a escola pública foi submetida.
Outra questão é a falta de diálogo e a incapacidade da escola de assimilar a nova cultura juvenil. Soligo defende que poder público, professores, gestores, alunos e pais se envolvam para discutir o problema.
Onde está a família?
Diante de uma turma com dificuldade de aprendizado, a professora Margarida Costa, da Escola Municipal Oliveira Viana, no Jardim Ângela, avisa: quem não terminar não vai brincar no intervalo. Ninguém terminou o exercício a tempo.
A classe inteira optou por ficar sob a tutela de um adulto no recreio. "A carência de atenção é tão grande que a possibilidade de usufruir de um tempo ao lado do professor deixou a turminha de crianças animada", explica Margarida.
Na escola da periferia da zona sul, a estratégia que a diretora, Jucileide Mauger, encontrou foi ampliar o diálogo com os alunos e abrir-se para a comunidade. Abrir espaço para a família participar das decisões é um dos segredos, no Jardim Angela ou no Alto de Pinheiros. No Oliveira Viana, pais de alunos ocuparam as salas de aula para um encontro de casais. No colégio Vera Cruz, há desde 2005 a Organização de Pais Solidários, com palestras sobre drogas, infância e sociedade.

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