“Para nós é difícil imaginar a importância dos jogos e das festas na sociedade antiga: hoje, tanto para o homem da cidade como para o do campo, existe apenas uma margem muito estreita entre uma atividade profissional laboriosa e hipertrofiada, e uma vocação familiar imperiosa e exclusiva. Toda a literatura política e social, reflexo da opinião contemporânea, trata das condições de vida e de trabalho. Um sindicalismo que protege os salários reais e seguros que reduzem o risco da doença e do desemprego: eis as principais conquistas populares, ao menos as mais aparentes na opinião pública, na literatura e no debate político. Mesmo as aposentadorias tornam-se cada vez menos possibilidades de repouso: são antes privilégios que permitem uma renda mais gorda. O divertimento, tornado quase vergonhoso, não é mais admitido, a não ser em raros intervalos, quase clandestinos: só se impõe como dado dos costumes uma vez por ano, durante o imenso êxodo do mês de agosto que leva às praias e às montanhas, à beira d’água, ao ar livre e ao sol uma massa cada vez mais numerosa, mais popular e ao mesmo tempo mais motorizada. Na sociedade antiga, o trabalho não ocupava tanto tempo do dia, nem tinha tanta importância na opinião comum: não tinha o valor existencial que lhe atribuímos há pouco mais de um século. Mal podemos dizer que tivesse o mesmo sentido. Por outro lado, os jogos e os divertimentos estendiam-se muito além dos momentos furtivos que lhes dedicamos: formavam um dos principais meios de dispunha uma sociedade para estreitar seus laços coletivos, para se sentir unida.” Philippe Ariès - História Social da Criança e da Família
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