domingo, 2 de maio de 2010


quinta-feira, 29 de abril de 2010

quarta-feira, 21 de abril de 2010

quarta-feira, 14 de abril de 2010

A day in the life

Às vezes me pergunto se não estou sendo muito pessimista, se não estou adotando uma atitude muito negativa, se não é por isso que vejo tantos problemas na escola e na educação. Pensava nisso ontem, a caminho do trabalho. O HTPC que tivemos antes das aulas reforçou esta impressão: coordenadores, diretores e colegas falavam de uma escola idílica. Fiquei confuso, porque essa não é a realidade que vejo no cotidiano de trabalho. Isso aprofundou em mim aquele medo de que seria eu o problema, dono de um olhar focado nas coisas ruins.
Mas a realidade do cotidiano resolveu esse dilema. Reproduzo abaixo as anotações que fiz em meu Diário de Classe, meu confidente e tábua de salvação, um instrumento do desespero, onde registro as crônicas da vida entre os muros da escola.

“Trabalhamos hoje o texto ‘Floresta abrigou primeiro milharal, diz estudo’. Não foi possível executar adequadamente a exposição oral que orientaria os trabalhos em função da recusa dos alunos em fazer silêncio. O nível de ruído oriundo da Avenida XXXXX também prejudicou o andamento da aula. Muitas janelas estão quebradas, e o pequeno alívio proporcionado pela refração do som pelos vidros não está presente hoje. A maçaneta da porta foi arrancada, o que obriga que se use uma tesoura para abri-la. Grupos numerosos de estudantes circulam o tempo todo pelos corredores, sendo necessário manter a porta fechada. A cada pequeno intervalo de tempo, alguém bate na porta. Ficar perto dela é perigoso: alguns a chutam com violência, arremessando-a contra quem estiver atrás.
O aluno XXXXXXX chegou com um atraso de 25 minutos, sendo impedido de assistir a primeira aula. Após ser admitido no segundo período, iniciou uma série de provocações e insultos a minha pessoa (citando textualmente: “está bravo? Então por que essa cara de bobo?”, “se está incomodado vai embora, cuzão”, entre outros). Procurei relevar inicialmente, e perguntei ao rapaz se havia algum problema, se havia motivo para essa atitude de enfentamento. No final da aula, após mais um insulto, perguntei a ele se havia esquecido de tomar seu medicamento, ao que me respondeu perguntando se eu já havia “chupado” hoje. Decidi que o limite tinha sido extrapolado: levei o aluno para a diretoria. No caminho, quase chorando, ele me pediu desculpas e quis se livrar da situação, alegando que a diretora ligaria para seu pai. Mantive a determinação e o levei para a diretoria”
Isto tudo aconteceu nas duas primeiras aulas. Mas havia mais coisa ainda por vir. Abaixo, o registro no Diário de Classe de uma outra aula:

“Conclusão da atividade com texto sobre o milho ancestral. No início da aula, quando tentava organizar a sala para começar os trabalhos, fui atingido no rosto por um fragmento de barra de chocolate [mais tarde vim a saber que se tratava de alimento fornecido pelo governo a título de ‘merenda escolar’]. Como não pude identificar o autor do arremesso, solicitei aos três alunos envolvidos na atividade de atirar o objeto fossem para a direção. Diante da recusa, fui obrigado a chamar a diretora para retirar os alunos da sala”.
Na volta pra casa, com um gosto de derrota na boca e um nó na garganta, tive o duvidoso prazer de perceber que minhas preocupações eram infundadas...
O pior é que querem que acreditemos que a culpa por esse caos na sala de aula é nossa, porque estamos adotando os métodos errados, porque somos antiquados e desinteressantes...

segunda-feira, 12 de abril de 2010

A qualidade do processo educacional pode ser medida em números?


Reportagem da Folha de São Paulo de hoje desmonta um esquema estelionatário que mostra bem como funciona o sistema educacional deste comecinho de século XXI no Brasil. Um "instituto" de Guarulhos envia para escolas do país todo uma carta parabenizando-as pela boa colocação nas avaliações de qualidade. Dizendo-se autorizados e mesmo apoiados pelo MEC e pelo Ministério da Educação, convidam a escola vitoriosa a participar de uma solenidade de entrega de certificado, e aí entra o golpe: para participar, basta pagar uma taxa de R$ 2.000,00, que pode ser parcelada em até 8 vezes.

Muitos donos de colégios e universidades caíram nesse golpe, e mais, obtiveram ganhos com isso. Uma diretora afirmou que sua escola, depois de premiada, recebeu 150 pedidos de matrícula a mais. E o pior é que muitas, quase todas, dessas escolas premiadas pelo instituto fajuto, eram na verdade mal colocadas nas avaliações e provas governamentais. Eram institutos de educação medíocres e fracassados. Mas a simples concessão de um prêmio, a simples comunicação de que uma avaliação externa indicou que ela superou os índices, serve de indicativo de sua qualidade, mesmo que o cotidiano não mostre isso, mesmo que os alunos que ali se formam sejam incapazes de realizar as tarefas mais básicas como ler, escrever e raciocinar corretamente.

É esse, afinal, o retrato das escolas de hoje. Todos os anos ficamos torcendo para que os índices apontem que melhoramos, e comemoramos quando isso acontece. Mas na prática, no dia a dia, é patente o fracasso, a decadência. Mesmo as escolas melhor avaliadas em qualquer desses certames questionáveis, sejam oficiais ou fajutos como o da reportagem, apresentam problemas sérios, profundos e que demorarão gerações para serem superados.

Essa política idiotizante das avaliações de qualidade só pode gerar isso que aí está: miragens que alimentam bobos e enriquecem raposas...


foto: http://www.jornalvicentino.com.br/home/wp-content/uploads/2008/10/SARESP1.jpg


Eis a reportagem sobre o golpe mencionado acima:

Golpe usa nome do MEC para premiar escola

Instituto de Guarulhos cobra R$ 2.000 para emitir certificado de qualidade que afirma ser baseado em índices oficiais

Anualmente, 150 escolas, supletivos e faculdades compram o direito de ser premiadas; ministro da Educação se disse perplexo

RICARDO GALLO DA REPORTAGEM LOCAL

Um instituto da Grande São Paulo vende, por R$ 2.000, um prêmio educacional baseado em um ranking inexistente do Ministério da Educação. Anualmente, 150 escolas, supletivos e faculdades compram desse instituto o direito de ser premiadas como as "melhores instituições de ensino do Brasil", à revelia do ministério.
Entre as premiadas, estão ao menos seis instituições de ensino superior reprovadas pelo MEC, além de colégios sem expressão e/ou mal colocados no Enem -exame que avalia o ensino médio. Elas propagandeiam o prêmio como se fosse oficial e disseram não saber que não era do MEC.
Não há ranking nacional que junte escolas e universidades -elas são avaliadas por exames diferentes.O ministério pedirá que a Polícia Federal investigue o caso e tomará as "providências judiciais cabíveis". Por meio da assessoria de imprensa, o ministro Fernando Haddad se disse perplexo. O MEC afirmou que fará campanha para divulgar em todo o Brasil índices oficiais, de modo a evitar o uso indevido de dados federais.
O Prêmio Nacional de Excelência em Qualidade no Ensino existe desde 2005, promovido pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa de Qualidade Gomes Pimentel, de Guarulhos.
Receberam o título de melhores do país escolas como o Qui-Mimo, de Guanambi (BA), o Jardim Escola Vovô Lima, de São Pedro da Aldeia (RJ), e o supletivo Supla, de Timbó (SC), além dos centros universitários Unieuro (DF) e Unibahia (BA).
A premiação foi em novembro, em um bufê no Tatuapé (zona leste de SP). Quem paga pelo prêmio tem direito a jantar, DVD, troféu e um certificado com brasão da República e o logotipo do governo federal ("Brasil, um país de todos").
Além de usar indevidamente o nome do ministro, o instituto colocou em seu site uma foto de Haddad como se ele estivesse presente em uma das edições do prêmio. Trata-se, na realidade, de imagem retirada do Google, de uma entrevista do ministro dada à TV UFMG.
Abordagem
É o Gomes Pimentel que procura as instituições para oferecer o prêmio, segundo relato de quatro "vencedores" à Folha. Primeiro, envia uma carta em que aponta o destinatário como potencial homenageado. São cinco critérios, quatro deles vagos: filosofia educacional, prática operacional, respeito ao aluno, responsabilidade social e qualidade de ensino.
Apenas o último item é medido pelo MEC, embora o instituto assegure se basear em dados oficiais. Em seguida, vem a cobrança dos R$ 2.000, que podem ser parcelados em até oito vezes. O instituto chama o pagamento de "adesão" e diz aos 150 premiados que o dinheiro corresponde aos custos do evento. O informativo, a que a Folha teve acesso, é claro: só recebe o troféu e o certificado de qualidade quem estiver na "solenidade".
A negociação pode, em alguns casos, resultar em desconto. A Folha falou com uma instituição que disse ter pago R$ 1.700. Nos últimos dois anos, a relação de instituições "vencedoras" aumentou -em 2007, eram 120. A edição de 2010, marcada para 29 de novembro, já tem 18 instituições homenageadas, informa o site do instituto.
Fonte: Jornal Folha de São Paulo, dia 12 de abril de 2010, caderno Cotidiano.

domingo, 11 de abril de 2010

Australopitecus sediba


Fonte: Folha de São Paulo, 9 de abril de 2010, pág A18


O fim da greve é o fim


Não dava pra imaginar um final mais melancólico para a greve. Trinta dias de paralisação parcial, com uma adesão decrescente dos professores, terminam assim, sem nenhum resultado, com direito a bate boca entre os manifestantes e a direção do movimento... E agora, o que fazer?
O governo, como dizia um colega dos velhos tempos de Isaías Matiazzo, age maquiavelicamente, vai minando a categoria, dividindo-a em classes (OFAs e efetivos, OFAs categorias F e L, aprovados e reprovados na prova classificatória para os OFA, e agora aprovados e reprovados na prova de "promoção por mérito"). Formam-se assim uma miríade de subcategorias entre a classe dos professores da rede estadual, cada uma delas com seus interesses específicos que inviabilizam a unidade em torno de uma causa. O governo criou o tenebroso BÔNUS, que em seus critérios (se é que há algum realmente), considera a assiduidade. O professor que optar pela greve perde o bônus... O professor que reprovar demais perde o bônus. O professor que não conseguir manter o aluno na escola perde o bônus. O bônus acaba criando uma imagem fictícia de escola que aprova, escondendo o fracasso escolar massivo que é a situação real. Mas isso não importa para os técnicos e burocratas, uma vez que as estatísticas ficam bonitas.

Ninguém, exceto nós que estamos vivendo isso cotidianamente, conseguiria imaginar o pesadelo que se tornou o ambiente escolar, assolado por legislações punitivas, assolado por incompetência profunda dos órgãos administrativos, assolado pela legião de jovens alucinados por anos de negligência parental e por exposição ao lixo mais torpe que sai das TVs e seus congêneres. Estar na escola hoje, na posição de professor, é estar exposto a situações surreais, inimagináveis...

E pelo que vimos nesta greve que se canibalizou nesta quinta-feira, dia 8 de abril de 2010, estamos dispostos a conviver com toda essa enxurrada de lodo...