Grilos no asfalto, tentando entender/sobreviver a essas mudanças todas que fazemos em seu habitat... Foto de Tulio Tsuji (http://farm3.static.flickr.com/2735/4491740393_5390b0f527_o.jpg)
sexta-feira, 31 de dezembro de 2010
segunda-feira, 13 de dezembro de 2010
Menina
Esta é a cachorrinha que segue os turistas pela cidade de Alcântara. Turistas e caminhantes. Está grávida, meio sumida... Quando vier a Alcântara, talvez ela siga você pelas ruas.
quinta-feira, 21 de outubro de 2010
terça-feira, 31 de agosto de 2010
Impressões sobre Alcântara - MA
O turista típico faz um passeio rápido, permanecendo poucas horas na cidade, obtendo assim uma visão superficial. É acompanhado por guias, alguns deles a serviço de órgãos da Prefeitura, que param aos pés dos monumentos mais chamativos, sob providenciais sombras, deitando informações “históricas” sobre a cidade e as construções. Pretendo em breve descobrir mais sobre esses serviços, sobre o comportamento dos turistas e sobre as fontes das informações que os guias prestam aos visitantes.
Aqueles que se detiverem por mais tempo na cidade, aqueles que tiverem força e ânimo para revirar as entranhas alcantarenses, descobrirão o que está por trás das belas fachadas e ruínas. Todas as informações que coletei sobre Alcântara nos relatos de visitantes na Internet se referiam a seus aspectos exteriores, eram informações obtidas por turistas que trilharam o circuito convencional. Este texto contem impressões sobre a cidade de Alcântara, no Maranhão, juntadas após uma semana e meia de andanças, conversas com moradores, observações e vivência direta com a realidade local. Deve ser lido como um relato de viajante, aquele produzido por alguém sob a influência do estranhamento. Ele não é fruto de uma investigação profunda, nem de esforços acadêmicos. São apenas impressões...
Um dos elementos da paisagem de Alcântara que mais atrai os olhares dos visitantes são as ruínas que se espalham pela cidade toda. Parecem testemunhas de um passado de riqueza e glória. Para a população local essas ruínas tem outros significados: serviram como fonte de matéria-prima para a construção de casas até a chegada das leis de proteção do patrimônio, servem como banheiro público (é comum ver motociclistas e motoristas pararem seus veículos para urinar nos recantos abrigados – mas nem tanto - da vista alheia; mesmo senhoras de idade provecta usam esse expediente para aliviar suas necessidades, e o visitante deve ter cuidado ao caminhar por entre as paredes centenárias para não pisar em resíduos indesejáveis...); as ruínas servem ainda de pastagem para bois e carneiros que vagam soltos pela cidade.
O conceito de moradia e as técnicas de construção são muito peculiares nesta região. As fundações das casas são feitas de pedra, o mesmo tipo usado para erigir as paredes de igrejas e casarões, o mesmo tipo presente na pavimentação das ruas do centro histórico. Apesar da pequena concentração demográfica e da fartura de espaço, as habitações são acanhadas, pequenas, quase claustrofóbicas. Vê-se logo que servem apenas de abrigo, e que a vida se dá ao ar livre, nas ruas e calçadas. O cômodo frontal dessas casas é, com frequência, lugar para a acomodação de redes, sempre de modo a permitir que aquele que se deita nelas tenha uma visão da rua através da porta, sempre aberta, que desemboca direto na calçada. As paredes internas não se elevam até o teto, nem são cobertas por forro, laje ou o que o valha; ao olhar para cima, o que se vê é o madeiramento que sustenta o telhado e as telhas que o recobrem. Isso indica outra relação com a privacidade, ou a inexistência dela... Não há espaço entre as casas, pois elas se escoram umas às outras, as paredes laterais são compartilhadas, talvez por economia. Dessa forma, uma rua típica de Alcântara é formada por uma fileira contínua de casas conjugadas, as quais só se distinguem pela diferença na cor e no tipo do revestimento. O banheiro fica junto à cozinha ou nos fundos. Os dejetos produzidos são levados a fossas simples, buracos no chão cobertos com lajes de cimento, ou são despejados diretamente em córregos; em muitas ruas o esgoto corre por valas expostas nas sarjetas. Os quintais ou são abertos, compartilhados por várias casas, ou limitados por cercas de bambus. Para se lavar roupas, usa-se uma mesa ou superfície plana e lisa, onde se colocam as roupas para serem esfregadas; na maior parte das casas, a água usada nessa operação vem de uma cisterna de cimento ou caixa d’água, empregando-se baldes para o transporte.
A relação com a água é outra item que chama atenção do estrangeiro. Grande parte das casas não possui hidrômetro, sendo cobrada uma taxa simbólica de valor único, de acordo com as informações dos moradores. O fornecimento de água é irregular, ocorrendo longos períodos de falta, diariamente, e às vezes por mais de um dia seguido. Para contornar essa dificuldade, os moradores empregam reservatórios, cisternas ou caixas d’água, que são usados nos momentos de corte no fornecimento. Água encanada parece ser um recurso recente; isso se traduz na forma como são feitos os encanamentos, instalados externamente e de maneira precária, ao contrário do hábito dos paulistas de embutir os canos nas paredes. Isso leva a crer que as técnicas de construção ainda não incorporaram a novidade da “água interna”.
Os moradores gostam muito de conversar entre si, e passam os dias sentados à frente de suas casas e locais de trabalho em grandes grupos, de seis ou mais pessoas. Dedicam-se ainda a jogos de tabuleiro. É comum, ao entrar num estabelecimento comercial, encontrá-lo vazio; em instantes o comerciante, que conversava ou jogava na rua, mantendo um olho nas suas portas, aparece. Esse hábito pode ser resultado do grande calor onipresente, opressivo. Todas as agências de serviços governamentais são servidas de aparelhos da ar-condicionado, assim como os veículos oficiais a serviço de órgãos públicos. Eles circulam lentamente nas ruas acidentadas da cidade, com os vidros escuros fechados...
Aprecia-se muito ouvir música em alto volume, nos carros, casas e estabelecimentos comerciais. Em dias de festejo, como o de São Benedito, que testemunhei, todos ligam seus aparelhos sonoros em volume máximo, numa aparente competição de decibéis. Os tradicionais tambores da festa, ufanados como legado dos antepassados africanos, parecem ser apenas tolerados. Assim que se calam entram em ação as radiolas, paredes de alto-falantes violentamente poderosas, ofendendo os ouvidos, fazendo tremer as construções... O estilo musical mais cultuado é o reggae, dançado aos pares numa coreografia onde os parceiros se juntam muito, lembrando o modo de dançar o forró.
Não existe jornal escrito. Todas as notícias são veiculadas por meio de carros, motos e bicicletas dotados de alto-falantes, que informam sobre andamentos de processos da Câmara local (geralmente narrados pelos próprios vereadores), programação do cinema, convites para eventos, propagandas políticas e comerciais. Na época em que cheguei, além dos jingles de candidatos a deputado, ouvia-se os anúncios da festa de São Benedito e da abertura de uma loja onde todas qualquer peça de roupa seria vendida a R$ 10,00, chamada “Caruaru é 10”. Ouvia-se também uma longa ladainha de uma vereadora esclarecendo sobre um processo que corria contra ela.
Há na cidade um bairro evangélico, formado ao redor de uma grande filial da igreja Assembléia de Deus. Chama-se Monte Sinai e tem a fama, entre os moradores, de ser pacato e isento de desordens morais... Muitas de suas casas foram edificadas em terrenos de ocupação, em mutirões liderados e coordenados por pastores.
A venda de víveres é um dos aspectos mais marcantes do cotidiano da cidade. O comércio é realizado de maneira precária; recomendações de conservação são solenemente ignoradas, prazos de validade expirados são comuns entre os produtos vendidos, mesmo nas farmácias. As margarinas, por exemplo, são armazenadas em gôndolas simples, sem a refrigeração recomendada expressamente nas embalagens; os estoques das casas comerciais são escuros, sujos, quentes e desorganizados. Nenhum dos estabelecimentos possui sistema de controle de estoques, operando ainda na era das máquinas de calcular. Na maior parte dos dias não se encontra a venda na cidade nenhum tipo de folhagem, como alfaces ou couves, e a variedade de frutas e verduras é reduzida: laranjas, bananas, maças e melancias, alguns poucos mamões, tomates e batatas. A venda de carne, entre todas as atividades comerciais, é a mais chocante: as peças ficam expostas ao ar livre, em ganchos ou balcões, sem refrigeração ou proteção contra insetos. Presume-se que tal carne venha dos animais abatidos na própria cidade, talvez aqueles que ficam vagando pelas ruínas e áreas vegetadas. Numa cidade onde a temperatura nunca cai abaixo de 30 graus, essa forma de comércio representa um atentado contra a saúde pública...
É comum ouvir relatos sobre crimes; moradores aconselham pedestres com aspecto de turistas a evitar certas áreas, como a rua chamada “Buraco Fundo”. Relatam-se assaltos, uso de drogas e furtos. Leis de trânsito são abertamente ignoradas: motociclistas circulam sem capacete, carregam crianças, trafegam com três ou mais passageiros; motoristas falam ao celular e nunca usam cinto de segurança. O serviço de transporte público é realizado por um caminhão em cuja carroceria se alinham bancos de madeira sem encosto, os populares “paus-de-arara”.
Promotores públicos, juízes, delegado, médicos, professores, funcionários de órgãos públicos, residem em São Luis, deslocando-se para trabalhar em Alcântara. Mesmo o prefeito da cidade, segundo informaram alguns, reside na capital, mantendo uma casa na cidade para visitas esporádicas...
A gente da cidade é receptiva, educada, prestativa. Em meu périplo frenético em busca de uma moradia, fui amparado por muitas pessoas, que se dispuseram a fazer contatos, caminhar comigo por longas distâncias, ajudar de todas as formas.
Há na cidade uma cadelinha vira-latas, simpática, que segue o caminhante por toda parte. Em nossas andanças ela foi companhia constante. É, segundo o senhor Ranilton da Pousada do Sossego, o guia turístico oficial da cidade... Sem nome, a apelidamos Menina. A ela dedico esse texto...
Aqueles que se detiverem por mais tempo na cidade, aqueles que tiverem força e ânimo para revirar as entranhas alcantarenses, descobrirão o que está por trás das belas fachadas e ruínas. Todas as informações que coletei sobre Alcântara nos relatos de visitantes na Internet se referiam a seus aspectos exteriores, eram informações obtidas por turistas que trilharam o circuito convencional. Este texto contem impressões sobre a cidade de Alcântara, no Maranhão, juntadas após uma semana e meia de andanças, conversas com moradores, observações e vivência direta com a realidade local. Deve ser lido como um relato de viajante, aquele produzido por alguém sob a influência do estranhamento. Ele não é fruto de uma investigação profunda, nem de esforços acadêmicos. São apenas impressões...
Um dos elementos da paisagem de Alcântara que mais atrai os olhares dos visitantes são as ruínas que se espalham pela cidade toda. Parecem testemunhas de um passado de riqueza e glória. Para a população local essas ruínas tem outros significados: serviram como fonte de matéria-prima para a construção de casas até a chegada das leis de proteção do patrimônio, servem como banheiro público (é comum ver motociclistas e motoristas pararem seus veículos para urinar nos recantos abrigados – mas nem tanto - da vista alheia; mesmo senhoras de idade provecta usam esse expediente para aliviar suas necessidades, e o visitante deve ter cuidado ao caminhar por entre as paredes centenárias para não pisar em resíduos indesejáveis...); as ruínas servem ainda de pastagem para bois e carneiros que vagam soltos pela cidade.
O conceito de moradia e as técnicas de construção são muito peculiares nesta região. As fundações das casas são feitas de pedra, o mesmo tipo usado para erigir as paredes de igrejas e casarões, o mesmo tipo presente na pavimentação das ruas do centro histórico. Apesar da pequena concentração demográfica e da fartura de espaço, as habitações são acanhadas, pequenas, quase claustrofóbicas. Vê-se logo que servem apenas de abrigo, e que a vida se dá ao ar livre, nas ruas e calçadas. O cômodo frontal dessas casas é, com frequência, lugar para a acomodação de redes, sempre de modo a permitir que aquele que se deita nelas tenha uma visão da rua através da porta, sempre aberta, que desemboca direto na calçada. As paredes internas não se elevam até o teto, nem são cobertas por forro, laje ou o que o valha; ao olhar para cima, o que se vê é o madeiramento que sustenta o telhado e as telhas que o recobrem. Isso indica outra relação com a privacidade, ou a inexistência dela... Não há espaço entre as casas, pois elas se escoram umas às outras, as paredes laterais são compartilhadas, talvez por economia. Dessa forma, uma rua típica de Alcântara é formada por uma fileira contínua de casas conjugadas, as quais só se distinguem pela diferença na cor e no tipo do revestimento. O banheiro fica junto à cozinha ou nos fundos. Os dejetos produzidos são levados a fossas simples, buracos no chão cobertos com lajes de cimento, ou são despejados diretamente em córregos; em muitas ruas o esgoto corre por valas expostas nas sarjetas. Os quintais ou são abertos, compartilhados por várias casas, ou limitados por cercas de bambus. Para se lavar roupas, usa-se uma mesa ou superfície plana e lisa, onde se colocam as roupas para serem esfregadas; na maior parte das casas, a água usada nessa operação vem de uma cisterna de cimento ou caixa d’água, empregando-se baldes para o transporte.
A relação com a água é outra item que chama atenção do estrangeiro. Grande parte das casas não possui hidrômetro, sendo cobrada uma taxa simbólica de valor único, de acordo com as informações dos moradores. O fornecimento de água é irregular, ocorrendo longos períodos de falta, diariamente, e às vezes por mais de um dia seguido. Para contornar essa dificuldade, os moradores empregam reservatórios, cisternas ou caixas d’água, que são usados nos momentos de corte no fornecimento. Água encanada parece ser um recurso recente; isso se traduz na forma como são feitos os encanamentos, instalados externamente e de maneira precária, ao contrário do hábito dos paulistas de embutir os canos nas paredes. Isso leva a crer que as técnicas de construção ainda não incorporaram a novidade da “água interna”.
Os moradores gostam muito de conversar entre si, e passam os dias sentados à frente de suas casas e locais de trabalho em grandes grupos, de seis ou mais pessoas. Dedicam-se ainda a jogos de tabuleiro. É comum, ao entrar num estabelecimento comercial, encontrá-lo vazio; em instantes o comerciante, que conversava ou jogava na rua, mantendo um olho nas suas portas, aparece. Esse hábito pode ser resultado do grande calor onipresente, opressivo. Todas as agências de serviços governamentais são servidas de aparelhos da ar-condicionado, assim como os veículos oficiais a serviço de órgãos públicos. Eles circulam lentamente nas ruas acidentadas da cidade, com os vidros escuros fechados...
Aprecia-se muito ouvir música em alto volume, nos carros, casas e estabelecimentos comerciais. Em dias de festejo, como o de São Benedito, que testemunhei, todos ligam seus aparelhos sonoros em volume máximo, numa aparente competição de decibéis. Os tradicionais tambores da festa, ufanados como legado dos antepassados africanos, parecem ser apenas tolerados. Assim que se calam entram em ação as radiolas, paredes de alto-falantes violentamente poderosas, ofendendo os ouvidos, fazendo tremer as construções... O estilo musical mais cultuado é o reggae, dançado aos pares numa coreografia onde os parceiros se juntam muito, lembrando o modo de dançar o forró.
Não existe jornal escrito. Todas as notícias são veiculadas por meio de carros, motos e bicicletas dotados de alto-falantes, que informam sobre andamentos de processos da Câmara local (geralmente narrados pelos próprios vereadores), programação do cinema, convites para eventos, propagandas políticas e comerciais. Na época em que cheguei, além dos jingles de candidatos a deputado, ouvia-se os anúncios da festa de São Benedito e da abertura de uma loja onde todas qualquer peça de roupa seria vendida a R$ 10,00, chamada “Caruaru é 10”. Ouvia-se também uma longa ladainha de uma vereadora esclarecendo sobre um processo que corria contra ela.
Há na cidade um bairro evangélico, formado ao redor de uma grande filial da igreja Assembléia de Deus. Chama-se Monte Sinai e tem a fama, entre os moradores, de ser pacato e isento de desordens morais... Muitas de suas casas foram edificadas em terrenos de ocupação, em mutirões liderados e coordenados por pastores.
A venda de víveres é um dos aspectos mais marcantes do cotidiano da cidade. O comércio é realizado de maneira precária; recomendações de conservação são solenemente ignoradas, prazos de validade expirados são comuns entre os produtos vendidos, mesmo nas farmácias. As margarinas, por exemplo, são armazenadas em gôndolas simples, sem a refrigeração recomendada expressamente nas embalagens; os estoques das casas comerciais são escuros, sujos, quentes e desorganizados. Nenhum dos estabelecimentos possui sistema de controle de estoques, operando ainda na era das máquinas de calcular. Na maior parte dos dias não se encontra a venda na cidade nenhum tipo de folhagem, como alfaces ou couves, e a variedade de frutas e verduras é reduzida: laranjas, bananas, maças e melancias, alguns poucos mamões, tomates e batatas. A venda de carne, entre todas as atividades comerciais, é a mais chocante: as peças ficam expostas ao ar livre, em ganchos ou balcões, sem refrigeração ou proteção contra insetos. Presume-se que tal carne venha dos animais abatidos na própria cidade, talvez aqueles que ficam vagando pelas ruínas e áreas vegetadas. Numa cidade onde a temperatura nunca cai abaixo de 30 graus, essa forma de comércio representa um atentado contra a saúde pública...
É comum ouvir relatos sobre crimes; moradores aconselham pedestres com aspecto de turistas a evitar certas áreas, como a rua chamada “Buraco Fundo”. Relatam-se assaltos, uso de drogas e furtos. Leis de trânsito são abertamente ignoradas: motociclistas circulam sem capacete, carregam crianças, trafegam com três ou mais passageiros; motoristas falam ao celular e nunca usam cinto de segurança. O serviço de transporte público é realizado por um caminhão em cuja carroceria se alinham bancos de madeira sem encosto, os populares “paus-de-arara”.
Promotores públicos, juízes, delegado, médicos, professores, funcionários de órgãos públicos, residem em São Luis, deslocando-se para trabalhar em Alcântara. Mesmo o prefeito da cidade, segundo informaram alguns, reside na capital, mantendo uma casa na cidade para visitas esporádicas...
A gente da cidade é receptiva, educada, prestativa. Em meu périplo frenético em busca de uma moradia, fui amparado por muitas pessoas, que se dispuseram a fazer contatos, caminhar comigo por longas distâncias, ajudar de todas as formas.
Há na cidade uma cadelinha vira-latas, simpática, que segue o caminhante por toda parte. Em nossas andanças ela foi companhia constante. É, segundo o senhor Ranilton da Pousada do Sossego, o guia turístico oficial da cidade... Sem nome, a apelidamos Menina. A ela dedico esse texto...
terça-feira, 17 de agosto de 2010
sexta-feira, 13 de agosto de 2010
Estado paga R$ 50,00 para aluno que frequentar as aulas de reforço de matemática
Piada pronta... Absurdo só concebível nas cabeças dos iluminados da Secretaria de Educação. Qual é o próximo passo? Pagar para o aluno sentar? Quanto vale fazer a lição de casa? E o dinheiro vai ser pago nas mãos dos estudantes, de 11 e 12 anos... Será que as autoridades da educação do Estado já ouviram falar em fundo do poço?
quarta-feira, 11 de agosto de 2010
Crumb e Shelton
Ontem, na Livraria da Vila, palestraram Robert Crumb e Gilbert Shelton. Apesar do espaço inadequado e dos vacilos do mediador e do tradutor, foi uma oportunidade interessante para conhecer de perto dois dos maiores nomes do quadrinho mundial. Valeu, também, pelos autógrafos...
segunda-feira, 2 de agosto de 2010
segunda-feira, 26 de julho de 2010
Sobre Stallone, o Brasil e os brasileiros
"Você pode explodir o país inteiro e eles vão dizer 'obrigado, aqui está um macaco para você levar de volta para casa’”.
“Não poderíamos ter feito o que fizemos (em outro lugar). Explodimos muita terra. Parecia assim: 'todo mundo traz o cachorro quente, vamos fazer um churrasco, vamos explodir essa cidade'”.
“Não poderíamos ter feito o que fizemos (em outro lugar). Explodimos muita terra. Parecia assim: 'todo mundo traz o cachorro quente, vamos fazer um churrasco, vamos explodir essa cidade'”.
Sylvester Stallone 22/07/2010. (fonte: http://www.pcsaudavel.com/2010/07/24/cala-boca-sylvester-stallone-polemica-entre-os-twitteiros/)
Essa polêmica a respeito das declarações de Stallone sobre sua experiência de filmar no Brasil é interessante para se analisar a mentalidade do país. De cara, surgiram inúmeras manifestações na internet, a grande maioria pejada de termos grosseiros e agressivos, que no lugar de argumentar se prestaram a um linchamento moral raivoso e irracional.
Mas se deixarmos de lado o nacionalismo magoado e o ressentimento cego veremos que o ator tem mais razão do que gostaríamos de admitir. Não é à toa que os produtores escolhem países como o Brasil para locações de filmes do tipo, uma vez que nos EUA o volume de legislação preventiva que entraria em ação virtualmente inviabilizaria as filmagens. Nossas autoridades são benevolentes com tais iniciativas. Ainda sofremos do mal de país colonizado que se derrete com qualquer traço de afago que os estrangeiros endinheirados dediquem a nós.
Mas o ponto mais certeiro da declaração de Stallone é o que se refere a nossa atitude em relação ao meio ambiente que nos cerca. Ao dizer que oferecemos macacos de recordação, pensei nos vendedores de caranguejos, que infestam nossas estradas com suas tristes fieiras de animais agonizantes; pensei nos vendedores de palmito, tão comuns nas vias que margeiam o que resta de nossas matas litorâneas; pensei nos traficantes de madeira, nos exploradores do comércio de orquídeas e animais silvestres, nos grandes produtores de soja e pecuaristas que exterminam a flora em troco de seus lucros obscenos. A história de nossa relação com a natureza que nos cerca é absolutamente abjeta: desde sempre enxergamos nas florestas e nos seus habitantes apenas cifrões, e exploramos esses "recursos" de maneira absurdamente ineficiente e destrutiva. Quem duvida, ou quer entender melhor esses mecanismos destrutivos que entraram em ação desde antes de 1500, leia a obra-prima do brasilianista Warren Dean, "A Ferro e Fogo". É uma revisão impressionante da história do Brasil...
Stallone talvez tenha errado por excesso de sinceridade, ao falar de um país onde nunca se usam os substantivos corretos nem os adjetivos cabíveis...
Fonte da foto: http://oglobo.globo.com/blogs/arquivos_upload/2010/07/240_2331-sylvester-stallone-comic-con.jpg
sexta-feira, 23 de julho de 2010
quinta-feira, 22 de julho de 2010
quarta-feira, 14 de julho de 2010
Brasília 3
Uma versão para o surgimento de Ceilândia. O trecho abaixo é parte de um texto extraído do site http://www.ceilandia.df.gov.br/005/00502001.asp?ttCD_CHAVE=4291
"Com a criação de Brasília, houve um grande fluxo migratório para a Nova Capital. Devido à sua característica básica de “cidade administrativa”, não pode ela, após sua consolidação, dar condições econômicas e sociais aos que a fizeram nascer, tendo em vista que a oferta de emprego não crescia na mesma proporção, numérica e qualitativa, face à demanda.
Paralelamente, desenvolviam-se, dentro do Plano Piloto, pequenos, mas inúmeros focos de “invasões”, na maioria das vezes em torno de canteiros de obra, ali permanecendo após a conclusão das mesmas.
Em 1969, com apenas nove anos de fundação, Brasília já tinha 70.128 favelados, que moravam em 14.607 barracos, em condições subumanas, para uma população prevista de 500 mil habitantes em todo o Distrito Federal. Naquele ano, foi realizado em Brasília um seminário sobre problemas sociais no Distrito Federal.
Foi assim que teve início a chamada pequena invasão do IAPI, que, posteriormente, somada aos agrupamentos favelados denominados Vila Tenório, Vila Esperança, Vila Bernardo Sayão, Vila Colombo, Morros do Querosene e do Urubu, Curral das Éguas e Placa das Mercedes, foi o favelamento mais gritante. Reconhecendo a gravidade do problema e suas conseqüências, o Governador Hélio Prates da Silveira (gaúcho de Passo Fundo) solicitou a erradicação das favelas à Secretaria de Serviços Sociais, comandada pelo potiguar Otomar Lopes Cardoso. No mesmo ano, foi criado um grupo de trabalho que mais tarde se transformou em Comissão de Erradicação de Favelas. Foi criada, então, em 1970, a Campanha de Erradicação das Invasões - CEI, órgão de remoção das referidas invasões, presidida pela primeira dama, a senhora Vera de Almeida Silveira.
A situação chegou a extremos em que se exigia uma providência. A solução adotada foi a de transferir todas as invasões para outra área, que já somava mais de 15 mil barracos e mais de 80 mil habitantes. A área escolhida, que antes pertenciam ao Município de Luziiânia, de propriedade da Fazenda Guariroba, e que parte do imóvel foi desapropriado pelo Estado de Goiás, transferido à União, era ocupada pelos Ministérios do Exército, da Aeronáutica e das Comunicações, foi cedida ao Governo do Distrito Federal para a implantação da nova cidade.
Em 27 de março de 1971, o Governador Hélio Prates da Silveira lançava a pedra fundamental da nova cidade, no local onde está a Caixa D`Água. Às nove horas daquele sábado, tinha início também o processo de assentamento das vinte primeiras famílias da invasão do IAPI. O Secretário Otomar Lopes Cardoso deu à nova localidade o nome de Ceilândia, inspirado na sigla "CEI" e na palavra de origem norte-americana "lândia", que significa cidade (o sufixo inglês estava na moda). Foi oficializado, na chegada das famílias ao assentamento, um culto ecumênico em ação de graças. A primeira família assentada, é a da senhora Edite Martins, mãe de três filhos menores e que recebia salário de 170 cruzeiros, na época. Esta família foi assentada na QNM 23, conjunto "P", lote 12, Ceilândia Sul.
A primeira vez que um ônibus fez a linha Ceilândia-Plano Piloto foi em 28 de março de 1971, um dia após a chegada da primeira família. Era um coletivo da TCB e o preço da passagem custou 60 centavos. Em 2 de abril de 1971, nascia, de parto normal, o primeiro ceilandense, Clébio Danton Melo Pontes, filho de Maria Eliete de Melo Pontes e Manuel da Ponte. Clébio se chamaria Ceilândio, mas graças a interferência do assistente social Reinaldo Pitanga, o pai do menino mudou de idéia.
A primeira coleta de lixo foi feita pelos garis Sebastião José Lourenço, Armando Campos Sobral e Antônio da Silva Sobrinho, em 31 de março, sob a coordenação do Serviço de Limpeza Urbana, com base em Taguatinga, e tendo como veículo de transporte o caminhão de placa 8547, conduzido por Amadeu Pereira da Silva.
Em 1971, já estavam demarcados 17.619 lotes, medindo 10x25 metros, numa área de 20 quilômetros quadrados. A NOVACAP fez a demarcação em 97 dias, com início em 15 de outubro de 1970. Em nove meses, a transferência das famílias estava concluída, com as ruas abertas de acordo com o projeto urbanístico, de autoria do arquiteto Ney Gabriel de Souza, com dois eixos cruzados em ângulo de 90 graus, formando a figura de um barril. Nos primeiros tempos foi um drama. A população carecia de água, de iluminação pública, de transporte coletivo, e lutava contra a poeira, a lama e as enxurradas."
Paralelamente, desenvolviam-se, dentro do Plano Piloto, pequenos, mas inúmeros focos de “invasões”, na maioria das vezes em torno de canteiros de obra, ali permanecendo após a conclusão das mesmas.
Em 1969, com apenas nove anos de fundação, Brasília já tinha 70.128 favelados, que moravam em 14.607 barracos, em condições subumanas, para uma população prevista de 500 mil habitantes em todo o Distrito Federal. Naquele ano, foi realizado em Brasília um seminário sobre problemas sociais no Distrito Federal.
Foi assim que teve início a chamada pequena invasão do IAPI, que, posteriormente, somada aos agrupamentos favelados denominados Vila Tenório, Vila Esperança, Vila Bernardo Sayão, Vila Colombo, Morros do Querosene e do Urubu, Curral das Éguas e Placa das Mercedes, foi o favelamento mais gritante. Reconhecendo a gravidade do problema e suas conseqüências, o Governador Hélio Prates da Silveira (gaúcho de Passo Fundo) solicitou a erradicação das favelas à Secretaria de Serviços Sociais, comandada pelo potiguar Otomar Lopes Cardoso. No mesmo ano, foi criado um grupo de trabalho que mais tarde se transformou em Comissão de Erradicação de Favelas. Foi criada, então, em 1970, a Campanha de Erradicação das Invasões - CEI, órgão de remoção das referidas invasões, presidida pela primeira dama, a senhora Vera de Almeida Silveira.
A situação chegou a extremos em que se exigia uma providência. A solução adotada foi a de transferir todas as invasões para outra área, que já somava mais de 15 mil barracos e mais de 80 mil habitantes. A área escolhida, que antes pertenciam ao Município de Luziiânia, de propriedade da Fazenda Guariroba, e que parte do imóvel foi desapropriado pelo Estado de Goiás, transferido à União, era ocupada pelos Ministérios do Exército, da Aeronáutica e das Comunicações, foi cedida ao Governo do Distrito Federal para a implantação da nova cidade.
Em 27 de março de 1971, o Governador Hélio Prates da Silveira lançava a pedra fundamental da nova cidade, no local onde está a Caixa D`Água. Às nove horas daquele sábado, tinha início também o processo de assentamento das vinte primeiras famílias da invasão do IAPI. O Secretário Otomar Lopes Cardoso deu à nova localidade o nome de Ceilândia, inspirado na sigla "CEI" e na palavra de origem norte-americana "lândia", que significa cidade (o sufixo inglês estava na moda). Foi oficializado, na chegada das famílias ao assentamento, um culto ecumênico em ação de graças. A primeira família assentada, é a da senhora Edite Martins, mãe de três filhos menores e que recebia salário de 170 cruzeiros, na época. Esta família foi assentada na QNM 23, conjunto "P", lote 12, Ceilândia Sul.
A primeira vez que um ônibus fez a linha Ceilândia-Plano Piloto foi em 28 de março de 1971, um dia após a chegada da primeira família. Era um coletivo da TCB e o preço da passagem custou 60 centavos. Em 2 de abril de 1971, nascia, de parto normal, o primeiro ceilandense, Clébio Danton Melo Pontes, filho de Maria Eliete de Melo Pontes e Manuel da Ponte. Clébio se chamaria Ceilândio, mas graças a interferência do assistente social Reinaldo Pitanga, o pai do menino mudou de idéia.
A primeira coleta de lixo foi feita pelos garis Sebastião José Lourenço, Armando Campos Sobral e Antônio da Silva Sobrinho, em 31 de março, sob a coordenação do Serviço de Limpeza Urbana, com base em Taguatinga, e tendo como veículo de transporte o caminhão de placa 8547, conduzido por Amadeu Pereira da Silva.
Em 1971, já estavam demarcados 17.619 lotes, medindo 10x25 metros, numa área de 20 quilômetros quadrados. A NOVACAP fez a demarcação em 97 dias, com início em 15 de outubro de 1970. Em nove meses, a transferência das famílias estava concluída, com as ruas abertas de acordo com o projeto urbanístico, de autoria do arquiteto Ney Gabriel de Souza, com dois eixos cruzados em ângulo de 90 graus, formando a figura de um barril. Nos primeiros tempos foi um drama. A população carecia de água, de iluminação pública, de transporte coletivo, e lutava contra a poeira, a lama e as enxurradas."
Brasília 2
E que tal uma outra visão de Brasília? Uma em que professores relatam que seus alunos, jovens da periferia (cidades satélites), e mesmo adultos dessas áreas não conhecem ainda o Plano Piloto? Que relatam a origem do nome Ceilândia (a maior das cidades satélites), que veio de CEI - Campanha de Erradicação das Invasões... Invasões que começaram depois que os operários envolvidos na construção da cidade e suas famílias foram dispensados como resíduo inútil. Ou de como esses mesmos operários e suas famílias tiveram que lutar para conseguir um espaço de memória, sediado agora no Museu da Memória Candanga.
A história de Brasília que nós, de outras regiões, conhecemos, é aquela que celebra a genialidade de Lúcio Costa e de Oscar Niemayer, a capacidade e visão de futuro de Kubitscheck, o martírio de Israel Pinheiro. Ninguém quer ver a outra história, a dos que acorreram de todos os cantos para dar sua contribuição em suor e sangue para a construção dessa capital, nem a história da natureza que teve que ceder seu espaço para a Novacap. Nem a história do que aconteceu depois de 21 de abril de 1960, até os dias de hoje. Esta cidade, que comemora 50 anos, está assentada sobre o sacrifício de milhares, que diariamente viajam quilômetros para servir, proteger, limpar, consertar...
4º Fórum Nacional de Museus - Brasília - 2010
MINICURSO: Elaboração de Projetos e Fomento para a Área Museológica (Ministrante: Átila Tolentino, especialista em gestão de políticas públicas de cultura e em gestão governamental, atua na Superintendência do IPHAN na Paraíba, e André Resende, especialista em gestão de políticas públicas de cultura e Chefe da Coordenação de Fomento e Financiamento do Ibram)
Antenado com as novidades conceituais e metodológicas que são a vanguarda nas ações educacionais no Brasil, nosso caro professor Átila Tolentino - jovem que ocupa cargo nas altas esferas do IPHAN – deixou de lado a aula expositiva e pôs em prática uma “dinâmica conceitual”: propôs aos participantes que respondessem questões como “o que é museu” e “qual o papel dos museus na sociedade”. A platéia mostrou-se ávida em participar, e assim foram-se construindo conceitos.
Se os métodos pedagógicos são modernos, o mesmo pode-se afirmar sobre os conceitos apresentados. A área de museologia sofre, à semelhança com a história e as outras ciências sociais, um intenso processo de revisão. Museus deixam de ser apenas o espaço onde se guardam e expõe coisas antigas, deixa de ser visto como uma representação fiel do passado. Passam a ser vistos como espaços de discussão e tem seus discursos explicitados. Um exemplo talvez ajude a ilustrar melhor essas novas concepções. O Museu Paulista possui, em seu acervo, diversas peças de mobiliário, vestuário e outros itens do século XIX. Esse material, dentro da nova ótica, deixa de ser visto como mera vitrine do passado, e passa a ser entendido como ponto de partida para discussões sobre a realidade socio-econômica da época que os produziu, suscitando questionamentos a respeito das relações entre as pessoas, e mesmo dos humanos com a natureza. Além disso, são cada vez mais comuns museus que tem como missão resgatar a cultura de comunidades antes não contempladas por tais instituições, como índios, quilombolas, moradores de periferias, imigrantes, etc.
No segundo módulo, buscou-se uma abordagem histórica a respeito das políticas públicas em relação à cultura no Brasil. Usando uma esquematização proposta por José Álvares Moisés, Átila apresentou o trajeto da política cultural brasileira dividida em 4 fases: uma do período imperial, encabeçada por ações de D. João e D. Pedro II (criação das primeiras insitituições culturais oficiais como Jardim Botânico, Real Biblioteca e Museu Real), uma caracterizada pelas ações do Estado Novo (que criou um aparato estatal com o intuito de interferir e gerir a cultura nacional), uma ligada ao governo militar (que subordinou a cultura aos interesses econômicos, vinculando-a ao desenvolvimento tecnológico e se aproximando da classe média) e, por fim, o último estágio que se iniciou em 1985 e dura até os nosso dias (marcado pelo sucateamento total na Era Collor e a lenta recuperação a partir do século XXI).
No terceiro módulo, introduziu-se o cerne do minicurso: como elaborar projetos para museus. Grande parte da discussão se concentrou no tema “fomento”: buscar recursos é uma das atividades centrais dos museus atualmente. Eles podem vir de três fontes: recursos do MinC, através do FNC (Fundo Nacional de Cultura), através de recursos captados pela lei Rouanet (onde empresas privadas concedem patrocínio mediante renúncia fiscal) e o mecenato. As discussões foram bastante acaloradas, uma vez que parte grande da audiência era formada por profissionais de museus que lutam , dia a dia, para conseguir fundos para seus projetos. Uma vez que o professor é um dos que ajudam a decidir sobre a aprovação dos pleitos, houve extensa seção de perguntas sobre dúvidas bastante específicas.
O curso em questão foi bastante proveitoso, uma vez que tratou de temas essenciais para o profissional de museu e permitiu a tomada de consciência sobre o perfil de atuação esperado.
Se os métodos pedagógicos são modernos, o mesmo pode-se afirmar sobre os conceitos apresentados. A área de museologia sofre, à semelhança com a história e as outras ciências sociais, um intenso processo de revisão. Museus deixam de ser apenas o espaço onde se guardam e expõe coisas antigas, deixa de ser visto como uma representação fiel do passado. Passam a ser vistos como espaços de discussão e tem seus discursos explicitados. Um exemplo talvez ajude a ilustrar melhor essas novas concepções. O Museu Paulista possui, em seu acervo, diversas peças de mobiliário, vestuário e outros itens do século XIX. Esse material, dentro da nova ótica, deixa de ser visto como mera vitrine do passado, e passa a ser entendido como ponto de partida para discussões sobre a realidade socio-econômica da época que os produziu, suscitando questionamentos a respeito das relações entre as pessoas, e mesmo dos humanos com a natureza. Além disso, são cada vez mais comuns museus que tem como missão resgatar a cultura de comunidades antes não contempladas por tais instituições, como índios, quilombolas, moradores de periferias, imigrantes, etc.
No segundo módulo, buscou-se uma abordagem histórica a respeito das políticas públicas em relação à cultura no Brasil. Usando uma esquematização proposta por José Álvares Moisés, Átila apresentou o trajeto da política cultural brasileira dividida em 4 fases: uma do período imperial, encabeçada por ações de D. João e D. Pedro II (criação das primeiras insitituições culturais oficiais como Jardim Botânico, Real Biblioteca e Museu Real), uma caracterizada pelas ações do Estado Novo (que criou um aparato estatal com o intuito de interferir e gerir a cultura nacional), uma ligada ao governo militar (que subordinou a cultura aos interesses econômicos, vinculando-a ao desenvolvimento tecnológico e se aproximando da classe média) e, por fim, o último estágio que se iniciou em 1985 e dura até os nosso dias (marcado pelo sucateamento total na Era Collor e a lenta recuperação a partir do século XXI).
No terceiro módulo, introduziu-se o cerne do minicurso: como elaborar projetos para museus. Grande parte da discussão se concentrou no tema “fomento”: buscar recursos é uma das atividades centrais dos museus atualmente. Eles podem vir de três fontes: recursos do MinC, através do FNC (Fundo Nacional de Cultura), através de recursos captados pela lei Rouanet (onde empresas privadas concedem patrocínio mediante renúncia fiscal) e o mecenato. As discussões foram bastante acaloradas, uma vez que parte grande da audiência era formada por profissionais de museus que lutam , dia a dia, para conseguir fundos para seus projetos. Uma vez que o professor é um dos que ajudam a decidir sobre a aprovação dos pleitos, houve extensa seção de perguntas sobre dúvidas bastante específicas.
O curso em questão foi bastante proveitoso, uma vez que tratou de temas essenciais para o profissional de museu e permitiu a tomada de consciência sobre o perfil de atuação esperado.
segunda-feira, 12 de julho de 2010
Brasília 1
Niemayer era um comunista de araque. Apesar dos largos espaços arborizados e dos conjuntos de casas de cara pra rua, sem muro nem cerca, ele não pensou nos pedestres. Atravessar uma rua em Brasília é uma aventura perigosa. Tem que ter na cabeça, como um mantra, a música do Liga Tripa:
"Nossa Senhora do Cerrado
Protetora dos pedestres
Que atravessam o eixão
Às seis horas da tarde
Fazei com que eu chegue são e salvo
Na casa da Noélia"
Mas parece que ninguém faz isso mesmo, só os turistas desavisados e os moradores de rua. Brasília é um deserto de carros e monumentos, perfumada pelo onipresente aroma deixado pelos resíduos de uma enorme população de rua...
domingo, 20 de junho de 2010
roberto piva
A escola segundo Roberto Piva
"[...] nossas escolas estão atrasadas pelo menos cem anos
em relação às últimas descobertas científicas no
campo da física, biologia, astronomia, linguagem,
pesquisa espacial, religião, ecologia,
poesia-cósmica, etc.,
provocando abandono das escolas no vício de linguagem &
perda de tempo
em currículos de adestramento, onde nunca ninguém vai
estudar Einstein, Gerard de Nerval, Nietzsche,
Gilberto Freyre, J. Rostand, Fourier, W.Heinsenberg, Paul Goodman, Virgílio, Murilo
Mendes, Max Born, Sousandrade, Hynek, G. Benn,
Barthes, Robert Sheckley, Rimbaud, Raymond
Roussel, Leopardi, Trakl, Rajneesh, Catulo, Crevel,
São Francisco, Vico, Darwin, Blake, Blavatsky,
Krucënych, Joyce, Reverdy, Villon, Novalis,
Marinetti, Heidegger & Jacob Boehme
& por essa razão a escola se coagulou em Galinheiro
onde se choca a histeria, o torcicolo & repressão
sexual,
não existindo mais saída a não ser fechá-la &
transformá-la em Cinema onde crianças &
adolescentes sigam de novo as pegadas da
Fantasia com muita bolinação no escuro."
Impressiona o modo como a arte é capaz de encontrar atalhos e explicar as coisas de modo sintético e preciso, onde a ciência precisaria de um longo, sistemático e penoso trajeto para chegar ao mesmo ponto... A escola apresentada por Roberto Piva em tão poucas linhas de versos brancos é um resumo da cara da instituição: a escola repressiva, monocromática e tecnicista dos anos 70 e 80, causadora de "torcicolos", tendinites, repressões e anulações do ego; e ainda assim incapaz de seguir os passos do desenvolvimento do conhecimento humano. E a visionária indicação da escola de hoje, caótica, mais sala de casa, boteco, balada, que escola... Seriam necessárias umas dez teses e dezoito dissertações para acertar na mosca desse jeito... Genial.
"[...] nossas escolas estão atrasadas pelo menos cem anos
em relação às últimas descobertas científicas no
campo da física, biologia, astronomia, linguagem,
pesquisa espacial, religião, ecologia,
poesia-cósmica, etc.,
provocando abandono das escolas no vício de linguagem &
perda de tempo
em currículos de adestramento, onde nunca ninguém vai
estudar Einstein, Gerard de Nerval, Nietzsche,
Gilberto Freyre, J. Rostand, Fourier, W.Heinsenberg, Paul Goodman, Virgílio, Murilo
Mendes, Max Born, Sousandrade, Hynek, G. Benn,
Barthes, Robert Sheckley, Rimbaud, Raymond
Roussel, Leopardi, Trakl, Rajneesh, Catulo, Crevel,
São Francisco, Vico, Darwin, Blake, Blavatsky,
Krucënych, Joyce, Reverdy, Villon, Novalis,
Marinetti, Heidegger & Jacob Boehme
& por essa razão a escola se coagulou em Galinheiro
onde se choca a histeria, o torcicolo & repressão
sexual,
não existindo mais saída a não ser fechá-la &
transformá-la em Cinema onde crianças &
adolescentes sigam de novo as pegadas da
Fantasia com muita bolinação no escuro."
(excerto de "Manifesto utópico-ecológico em defesa da poesia & do delírio" de 1983, obtido em http://www.tertuliaonline.com.br/post/mostra_post.php?id=73)
Impressiona o modo como a arte é capaz de encontrar atalhos e explicar as coisas de modo sintético e preciso, onde a ciência precisaria de um longo, sistemático e penoso trajeto para chegar ao mesmo ponto... A escola apresentada por Roberto Piva em tão poucas linhas de versos brancos é um resumo da cara da instituição: a escola repressiva, monocromática e tecnicista dos anos 70 e 80, causadora de "torcicolos", tendinites, repressões e anulações do ego; e ainda assim incapaz de seguir os passos do desenvolvimento do conhecimento humano. E a visionária indicação da escola de hoje, caótica, mais sala de casa, boteco, balada, que escola... Seriam necessárias umas dez teses e dezoito dissertações para acertar na mosca desse jeito... Genial.
carlos adão
Quem tem o hábito de ler pixações já deve ter visto o famoso fundo preto e letras verdes com o indefectível nome "Carlos Adão", sozinho ou acompanhado de mensagens como "Volte Carlos Adão", "Amar Carlos Adão", "Carlos Adão é USP", "Carlos Adão Sexo", e muitas outras variações. Já vi em todas as cidades da Baixada Santista, em cidades do Vale do Ribeira, por toda a Capital, ao longo da Régis Bittencourt, no litoral norte de SP.
É fácil elucidar o "mistério" Carlos Adão: veja o vídeo http://www.youtube.com/watch?v=IEc--33LOk0
foto: http://ideiasemhifen.files.wordpress.com/2009/02/dsc00471.jpg
sexta-feira, 18 de junho de 2010
segunda-feira, 14 de junho de 2010
quinta-feira, 10 de junho de 2010
Estudos Maranhenses: "A Economia Brasileira no Fim da Época Colonial: a diversificação da produção, o ganho do monopólio", de José Jobson de A. Arruda
Resenha do artigo de José Jobson de Andrade Arruda publicado na “Revista de História” da USP nº 119, de 1988, que trata da economia brasileira no final do período colonial, onde se discute a economia maranhense do período.
Este artigo tem como objetivo analisar um período específico da economia brasileira, aquele situado entre a decadência da mineração e da economia do açúcar e a ascensão da cafeicultura, concentrando-se em dados referentes ao fim do século XVIII e início do XIX. Nessa época ocorreu uma intensa diversificação da produção econômica no Brasil, momento em que novos produtos fizeram-se presentes nas tabelas de exportação e quebraram o antigo padrão monocultor do país. É um período em que os ganhos de Portugal garantidos pelo monopólio aumentam. Nesse quadro, o país experimentou um surto de desenvolvimento econômico, e é esse o centro do debate aqui desenvolvido: qual a natureza dessa euforia, real ou falsa? Arruda busca nos índices e dados contábeis do período elementos que corroborem uma revisão na interpretação historiográfica desse momento econômico.
A DIVERSIFICAÇÃO DA PRODUÇÃO E DAS EXPORTAÇÕES COLONIAIS (p. 3)
Para tornar patente a diversificação da produção brasileira, Arruda analisou o “rol das frotas de Pernambuco e Rio de Janeiro”. Em 1749, eram 35 os produtos exportados; já em 1796 eram 126. Para ele, esse aumento é fruto de uma “política agressiva” adotada por Pombal e mantida por seus sucessores.
Dentre os 126 produtos exportados, 13 deles representavam 83,2% (ou 82,5%, conforme citado em outro trecho) do total das exportações. Entre eles, os derivados da cana-de-açúcar ainda ocupam lugar de destaque, com 36% do total de exportações. É um número expressivo ainda, mas bastante diferente do que ocorria nos séculos XVI e XVII, quando os derivados da cana ocupavam a quase totalidade das exportações. Em segundo lugar nas exportações vem o algodão, produto novo, com 24,4%. Esse item está intimamente ligado com a Revolução Industrial em curso na Europa, constituindo-se uma de suas principais matérias-primas. Outro destaque da lista de exportações é o arroz, que representa 4% do total exportado, e que é “fruto da política de estímulo dos ilustrados portugueses e das autoridades governamentais”. A presença do cacau (2,7%) indica a introdução do consumo do produto na Europa. Em resumo, pode-se afirmar que as exportações brasileiras desse período estavam centralizadas em duas categorias de produtos: alimentos e matérias primas. Isso sinaliza o papel do Brasil na economia do período (p. 3 – 4).
Arruda analisa também o destino destes produtos, e extrai conclusões a partir de suas constatações. Dos 126 produtos exportados, 70 eram consumidos ou transformados industrialmente em Portugal, o que indica uma “conexão entre a política de fomento agrícola no Brasil com a política de desenvolvimento industrial de Portugal”. Em outras palavras, na engenharia econômica idealizada pelos administradores portugueses imbuídos dos novos princípios econômicos iluministas o Brasil seria uma ferramenta de apoio para o desenvolvimento industrial da metrópole, fornecedor de matérias-primas e de alimentos que liberassem os braços portugueses da lavoura para a indústria e ainda se constituiria num mercado consumidor da produção portuguesa (78,4% dos produtos industriais lusitanos destinados à venda em seu império vinham desembocar nos portos braslieiros – p 7 ). Os outros 56 produtos que eram reexportados para as “Nações Estrangeiras” serviam ainda como garantia de superávit na balança comercial portuguesa.
Dentre os 126 produtos exportados, 13 deles representavam 83,2% (ou 82,5%, conforme citado em outro trecho) do total das exportações. Entre eles, os derivados da cana-de-açúcar ainda ocupam lugar de destaque, com 36% do total de exportações. É um número expressivo ainda, mas bastante diferente do que ocorria nos séculos XVI e XVII, quando os derivados da cana ocupavam a quase totalidade das exportações. Em segundo lugar nas exportações vem o algodão, produto novo, com 24,4%. Esse item está intimamente ligado com a Revolução Industrial em curso na Europa, constituindo-se uma de suas principais matérias-primas. Outro destaque da lista de exportações é o arroz, que representa 4% do total exportado, e que é “fruto da política de estímulo dos ilustrados portugueses e das autoridades governamentais”. A presença do cacau (2,7%) indica a introdução do consumo do produto na Europa. Em resumo, pode-se afirmar que as exportações brasileiras desse período estavam centralizadas em duas categorias de produtos: alimentos e matérias primas. Isso sinaliza o papel do Brasil na economia do período (p. 3 – 4).
Arruda analisa também o destino destes produtos, e extrai conclusões a partir de suas constatações. Dos 126 produtos exportados, 70 eram consumidos ou transformados industrialmente em Portugal, o que indica uma “conexão entre a política de fomento agrícola no Brasil com a política de desenvolvimento industrial de Portugal”. Em outras palavras, na engenharia econômica idealizada pelos administradores portugueses imbuídos dos novos princípios econômicos iluministas o Brasil seria uma ferramenta de apoio para o desenvolvimento industrial da metrópole, fornecedor de matérias-primas e de alimentos que liberassem os braços portugueses da lavoura para a indústria e ainda se constituiria num mercado consumidor da produção portuguesa (78,4% dos produtos industriais lusitanos destinados à venda em seu império vinham desembocar nos portos braslieiros – p 7 ). Os outros 56 produtos que eram reexportados para as “Nações Estrangeiras” serviam ainda como garantia de superávit na balança comercial portuguesa.
O GANHO DE MONOPÓLIO PORTUGUES NO BRASIL (p. 7)
Arruda se dedica, em outro segmento, a analisar dados que demonstram a enorme lucratividade dos portugueses amparados no sistema de monopólio (pp. 7-9). Observa os dois sentidos: primeiro, contabilizando os ganhos de Portugal com a venda ou reexportação dos produtos brasileiros, observando os sobrepreços obtidos nessa negociação (valor resultante da diferença entre o que era pago ao produtor brasileiro e o que era cobrado do comprador de alhures). Em alguns casos, essa cifra atingia mais de 700% (Pau-brasil – p.8). Depois, analisa os lucros da metrópole com a exportação de seus produtos para o Brasil, observando a diferença entre os custos de produção e os preços de venda na colônia. A lucratividade nessa etapa é menor, ficando na média dos 50% de sobrepreço. A conclusão da análise dessas cifras leva à seguinte formulação: os maiores lucros de Portugal estavam na revenda de produtos brasileiros no exterior, mas não se pode desprezar o sobrelucro do caminho inverso, também expressivo.
Desse segmento, bastante interessante, pode-se apreciar a lista de produtos exportados de Portugal para o Brasil: cobre, azeite, manteiga, ferro, aço, baeta (um tipo de tecido felpudo, de lã ou algodão, com pelos em ambas as faces[1]), bacalhau e, o mais caro, a bretanha, um tipo de tecido inglês muito consumido na colônia. Analisando, podemos perceber a presença de produtos que poderiam facilmente ser obtidos no Brasil, não fossem as medidas restritivas à produção interna e a falta de iniciativa econômica dos colonos, mais preocupados em produzir os bens desejados pelo mercado externo. No rol de produtos exportados pelo Brasil e reexportados com sobrepreço por Portugal estão presentes muitos artigos provenientes do extrativismo, entre os quais couros de animais silvestres como veados e lobos marinhos, o que pode indicar a natureza ecologicamente danosa de relação entre os colonos e a natureza do Brasil.
Desse segmento, bastante interessante, pode-se apreciar a lista de produtos exportados de Portugal para o Brasil: cobre, azeite, manteiga, ferro, aço, baeta (um tipo de tecido felpudo, de lã ou algodão, com pelos em ambas as faces[1]), bacalhau e, o mais caro, a bretanha, um tipo de tecido inglês muito consumido na colônia. Analisando, podemos perceber a presença de produtos que poderiam facilmente ser obtidos no Brasil, não fossem as medidas restritivas à produção interna e a falta de iniciativa econômica dos colonos, mais preocupados em produzir os bens desejados pelo mercado externo. No rol de produtos exportados pelo Brasil e reexportados com sobrepreço por Portugal estão presentes muitos artigos provenientes do extrativismo, entre os quais couros de animais silvestres como veados e lobos marinhos, o que pode indicar a natureza ecologicamente danosa de relação entre os colonos e a natureza do Brasil.
O COMÉRCIO MARANHENSE NO FIM DA ÉPOCA COLONIAL (p. 9)
Nesse segmento do artigo, Arruda se dedica a situar a dinâmica econômica do Maranhão no quadro geral do Brasil, na busca por compreender os fatores de sua prosperidade. Nesse período, a economia maranhense se fundamentava na produção de algodão, que representava entre 73% e 82% de suas exportações. Outro produto de destaque era o arroz, o que leva à conclusão de que o desenvolvimento agrícola era a mola mestra da economia dessa região. No quadro geral, o Maranhão era a 4º província em ordem de volume de exportações, representando 11,7% do total brasileiro no período entre 1796 e 1807 (p.10). Mesmo superada em volume de exportações por outras 3 províncias, a economia maranhense se destacava em função dos superávits na sua balança comercial, uma vez que recebia uma quantidade relativamente pequena de produtos portugueses (8,7% do total recebido pelo Brasil no período analisado). Outro dado singular da economia maranhense era sua autonomia em relação à política econômica brasileira, o que se apreende a partir da constatação de que a retração geral do comércio com Portugal a partir da abertura dos portos em 1808 foi pouco expressiva na região.
Arruda aponta, no entanto, que esse superávit propalado por muitos pode, na verdade, se revelar menos expressivo, uma vez que na contabilidade realizada para se obter tal índice omitiu-se os gastos com a importação de escravos. De acordo com Jerônimo de Viveiros, nas primeiras décadas do século XIX, chegavam aos portos do Maranhão 2000 escravos por ano[2].
Arruda aponta, no entanto, que esse superávit propalado por muitos pode, na verdade, se revelar menos expressivo, uma vez que na contabilidade realizada para se obter tal índice omitiu-se os gastos com a importação de escravos. De acordo com Jerônimo de Viveiros, nas primeiras décadas do século XIX, chegavam aos portos do Maranhão 2000 escravos por ano[2].
A FALSA EUFORIA MARANHENSE DO FIM DA ÉPOCA COLONIAL? (p. 19)
De acordo com Arruda, autores como Roberto Simonsen e Celso Furtado, ao analisarem esse momento de diversificação produtiva no Brasil dos fins do século XVIII, apontaram uma “falsa euforia” advinda de fatores circunstanciais (“Revolução Industrial, Independência dos EUA, Revolução Francesa, Guerras Napoleônicas, Bloqueio Continental, Contra-Bloqueio Marítimo e Desorganização do Império Espanhol na América” – p.20). Nessa visão, o Maranhão seria exceção por ter demonstrado um avanço econômico real. Essa linha interpretativa acabou aceita e se tornou presente em diversos trabalhos desde então.
Arruda, amparado nos dados que coletou e organizou neste artigo, e em consonância com as ideias de Caio Prado Junior, tem uma visão diferente: apresenta as modificações econômicas desse período como resultado de movimentos estruturais (“passagem da acumulação primitiva para a sociedade industrial, emergência das revoluções burguesas, crise do sistema colonial” – p. 20). Isso faria do Maranhão não exceção, mas exemplo do que ocorria na economia brasileira do período.
Arruda, amparado nos dados que coletou e organizou neste artigo, e em consonância com as ideias de Caio Prado Junior, tem uma visão diferente: apresenta as modificações econômicas desse período como resultado de movimentos estruturais (“passagem da acumulação primitiva para a sociedade industrial, emergência das revoluções burguesas, crise do sistema colonial” – p. 20). Isso faria do Maranhão não exceção, mas exemplo do que ocorria na economia brasileira do período.
Bibliografia
ARRUDA, José Jobson de Andrade. A Economia Brasileira no Fim da Época Colonial: a diversificação da produção, o ganho do monopólio e a falsa euforia do Maranhão. In: Revista de História nº119 (nova série) pp 3 – 21. USP: São Paulo, 1988.
VIVEIROS, Jerônimo de. Alcântara no seu passado econômico, social e político. São Luís: Fundação Cultural do Maranhão, 1977.
WIKIPEDIA. http://pt.wiktionary.org/wiki/baeta.%20Acesso%20em%2010/06/2010.
[1] Wikipedia. http://pt.wiktionary.org/wiki/baeta
[2] VIVEIROS, Jerônimo de. Alcântara no seu passado econômico, social e político. São Luís: Fundação Cultural do Maranhão, 1977. p. 59.
VIVEIROS, Jerônimo de. Alcântara no seu passado econômico, social e político. São Luís: Fundação Cultural do Maranhão, 1977.
WIKIPEDIA. http://pt.wiktionary.org/wiki/baeta.%20Acesso%20em%2010/06/2010.
[1] Wikipedia. http://pt.wiktionary.org/wiki/baeta
[2] VIVEIROS, Jerônimo de. Alcântara no seu passado econômico, social e político. São Luís: Fundação Cultural do Maranhão, 1977. p. 59.
domingo, 6 de junho de 2010
domingo, 30 de maio de 2010
sexta-feira, 28 de maio de 2010
quarta-feira, 26 de maio de 2010
Governo neoliberal do Estado de São Paulo: piada de mau gosto...
Manchete da Folha de hoje: "SP abandona exigência para contratar professor". Depois de prejudicar mais de 40 mil profissinais e milhões de alunos, o governo de São Paulo recua em suas tentativas de impor a lógica de mercado à educação. Vai contratar mesmo os que foram reprovados em suas "avaliações", vai contratar mesmo os que nem fizeram a prova, vai contratar pedagogos para ministrar disciplinas específicas... O motivo: escassez de professores. São poucos os obstinados que insistem em ganhar pouco, sofrer violências dentro e fora das salas de aula. Os que ainda insistem tem que se submeter a esses exames constrangedores que, do ponto de vista técnico, são mais do que questionáveis. Uma avaliação que não avalia nada, que despreza aspectos essenciais de um bom profissional, focando no saber enciclopédico e na capacidade de seguir as modas pedagógicas.
Na cidade de São Paulo, um indivíduo que possua licenciatura em qualquer área pode encontrar em poucos dias um emprego mais bem remunerado que a docência no estado. Muitos licenciados preferem a informalidade ao regime de trabalho oferecido pelas escolas estaduais...
Esse governo não mostra nada exceto uma sucessão de trapalhadas e medidas contraditórias, irracionais e maldosas. E ainda quer chegar ao controle do país. Estamos quase no meio de 2010 e a pasta da Educação ainda não conseguiu resolver o problema básico de contratação de professores, por conta de sua própria incompetência. E depois, no final do ano, ainda tem a cara de pau de submeter os alunos a provas para detectar o seu nível de aprendizado, e com base nesses resultados pune as escolas. Alunos e escolas que estão sendo prejudicados pelas próprias medidas do governo. O sistema de ensino público do estado de São Paulo funcionaria melhor se esses escalões burocráticos fossem extintos...
segunda-feira, 24 de maio de 2010
Análise de notícias veiculadas no jornal "Folha de São Paulo" sobre a educação
Algumas notícias, veiculadas semana passada, no Jornal Folha de São Paulo: dia 19 de maio divulgou-se o caso de uma professora do RS que receberá uma indenização de R$2.000,00 da família de um aluno que a havia agredido. A professora tentava impedir que o rapaz, que tinha 13 anos na época, atirasse frutos numa colega. Ele então segurou a professora por um braço e deu-lhe repetidos tapas. Abalada, ela teve que se afastar e fazer acompanhamento psicológico.
A especialista em educação Ângela Soligo, da UNICAMP, não concorda com o desfecho da questão. Segundo suas declarações para o jornal, “é complicado quando se criminaliza um conflito no ambiente escolar. Quando se recorre à Justiça, estão dizendo que o problema está fora da escola". Em sua opinião, os pais deveriam ter sido chamados para um “diálogo”.
Dia seguinte, 20 de maio, novo caso noticiado: uma família de Belo Horizonte deverá pagar uma indenização de R$ 8.000,00 a uma colega de escola de seu filho. O rapaz, de idade não revelada, foi condenado por bullying. Segundo o jornal,
A especialista em educação Ângela Soligo, da UNICAMP, não concorda com o desfecho da questão. Segundo suas declarações para o jornal, “é complicado quando se criminaliza um conflito no ambiente escolar. Quando se recorre à Justiça, estão dizendo que o problema está fora da escola". Em sua opinião, os pais deveriam ter sido chamados para um “diálogo”.
Dia seguinte, 20 de maio, novo caso noticiado: uma família de Belo Horizonte deverá pagar uma indenização de R$ 8.000,00 a uma colega de escola de seu filho. O rapaz, de idade não revelada, foi condenado por bullying. Segundo o jornal,
o adolescente xingou e ofendeu sua colega, chamando-a de ‘g.e.’, que viria a ser ‘grupo das excluídas’, pelo fato de se relacionar com outras colegas que eram classificadas pelo estudante como ‘lésbicas’. A vítima foi classificada ainda de ‘interesseira’ e ‘prostituta’ por ter começado a namorar um colega mais rico do colégio. Os apelidos e insinuações não cessaram mesmo após os pais da aluna se queixarem à escola.
A escola, acionada judicialmente pela família, foi isentada pela justiça, mas terá que pagar parte das custas judiciais.
Consideradas em conjunto, essas notícias são um bom indicador das condições das escolas atualmente, deixando claro as situações enfrentadas diariamente pelos professores.
Mas o jornal não parou por aí. No dia 23, publicou uma reportagem especial que tinha como chamada “A cada dia, um professor se licencia por dois anos”. O texto discutia a questão dos professores readaptados. No estado de São Paulo, readaptados são professores que, por motivos de saúde, solicitam o afastamento, por dois anos, das salas de aula, passando a desempenhar outras funções na escola. A reportagem se baseou em dados de uma pesquisa feita por Maria de Lourdes de Moraes Pezzuol, ela própria uma professora readaptada que decidiu transformar sua experiência e suas descobertas em dissertação de mestrado. O tom da reportagem, no entanto, é bastante incômodo. Inicia-se o texto da seguinte forma
“O professor de história Carlos, 42, fala sozinho às vezes. Seu coração, conta, dispara sem motivo aparente. "Não conseguia controlar os alunos. Queria passar o conteúdo, poucos me ouviam. Foi me dando uma angústia. Fiquei nervoso." Não era assim. "Eu era bem calmo", afirma, referindo-se ao período anterior a 2004, quando entrou como docente temporário na rede de ensino paulista. Aprovado um ano depois em concurso, foi considerado apto a dar aulas, na zona sul da capital. Passados três anos, obteve uma licença médica, que se renova até hoje, sob o diagnóstico de disforia - ansiedade, depressão e inquietude. Carlos espera nova perícia. Quer se tornar readaptado -situação de servidores com graves problemas de saúde, que ficam ao menos dois anos afastados da sala de aula. Fazem atividades administrativas na secretaria e na biblioteca, por exemplo.”
Mais adiante nessa reportagem o jornal desfia sua opinião através de uma frase do doutor em educação Rudá Ricci, que transcrevo textualmente: “esta geração é muito ativa. O professor se vê frustrado dia a dia por não conseguir a atenção deles". Segundo ele, os professores erram por esperar encontrar alunos “quietos e enfileirados”.
Para finalizar uma sequência de “análises” sobre a educação, a Folha publicou hoje uma matéria que descreve o que seria a solução para o problema. Com o título “Escolas de Nova York têm autonomia para gerenciar verbas e contratar professores”, o jornal descreve o caminho de salvação das escolas do Bronx, em NY: a adoção de um “modelo de negócios para a realidade de um sistema educacional”. Trata-se de dar aos diretores das escolas total liberdade para escolher, demitir, punir e premiar seus professores. Relata-se o caso de uma escola onde o teste de escolha dos profissionais é uma sabatina de 5 horas, onde o diretor avalia não os conhecimentos ou a capacidade do professor, mas sua disposição para aceitar críticas e reorientar seu trabalho, ou seja, obedecer ordens. As escolas que conseguem “melhorar seus índices” recebem bônus, e as que fracassam, são extintas (qualquer semelhança com o sistema em implantação no estado de São Paulo não é mera coincidência). Ressalte-se que esse sistema foi implantado em NY na gestão de Michael Bloomberg, bilionário das telecomunicações. Ou seja, um indivíduo dotado de uma visão antes mercantilista que social dos processos humanos. Concepções que agradam tanto ao jornal quanto aos setores políticos ligados ao neoliberalismo que tentam a todo custo impor sua agenda ao Brasil.
O que se conclui, após a análise destas notas jornalísticas, é que existe uma parcela importante de pessoas que insistem em reputar aos professores toda a responsabilidade pelo caos e pelo fracasso do sistema escolar. É o que faz, por exemplo, o especialista Rudá Ricci, ao indicar uma inadequação dos docentes ao que chama de “geração muito ativa”. As duas primeiras notícias às quais me referi neste texto mostram a natureza dessa “atividade”: violência, desrespeito, descaso, indiferença. Não concordo com o especialista, porque o que vejo no meu dia a dia como professor não é uma resistência juvenil sadia a um sistema obsoleto, mas sim um cenário inimaginável de inadequação total das novas gerações a toda e qualquer norma social de conduta e convivência.
O fracasso da educação é um problema mundial, e é reflexo de uma crise muito maior, que extrapola seus limites. O que se manifesta nas escolas hoje é o sintoma de uma crise social sem precedentes, com desfecho imprevisível.
Fonte da ilustração: http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u738445.shtml (trata-se da ilustração que venceu o concurso da Folha de São Paulo. Seu autor é Fernando Real)
quinta-feira, 20 de maio de 2010
terça-feira, 18 de maio de 2010
Resenha - "O que é a Comuna?" de Karl Marx
Karl Marx: seu tempo e suas ideias
Quem era o homem que observou os acontecimentos da França de 1871 e extraiu deles considerações e conclusões profundas a respeito da dinâmica social daquele país, de suas diretrizes econômicas e instituições políticas? Compreender o escrito “O que é a Comuna?” é tarefa que exige, antes de qualquer coisa, que se saiba melhor de que ponto seu discurso é emanado.
Karl Marx nasceu numa Europa que ainda sentia as vibrações das grandes alterações trazidas pela Revolução Francesa. Filho de um advogado pequeno burguês de origem judaica, membro de uma família acossada pelo antissemitismo que se viu forçada à conversão ao protestantismo, ele cresceu numa região fronteiriça recém assimilada pela Prússia. Um governo de tendências absolutistas havia sido imposto pelo Congresso de Viena e tentava extinguir as influências da Revolução de 1789, enfrentando resistência quase sempre. Nesse cenário, ocorria ainda a consolidação e o antagonismo de duas forças jovens em ascensão: a burguesia e proletariado. Marx viveu no limiar de um período de transição histórico onde as forças sociais e econômicas se reacomodavam, e cuja configuração final ainda era indefinida. As possibilidades estavam abertas.
Sua formação foi variada, mas no doutorado Marx dedicou-se à filosofia. Impossibilitado de alcançar a almejada cátedra na universidade por conta de suas posições ideológicas divergentes das dos mandatários, ele encontrou no jornalismo um canal para veiculação de suas concepções. Desde a juventude, Marx preocupou-se com questões concernentes ao bem-estar da humanidade. No cenárrio em que viveu, identificou-se com a classe operária e se alinhou aos socialistas que buscavam formas de solucionar as mazelas que atingiam esse segmento da sociedade. Descontente com as ideias socialistas existentes, dedicou-se à formulação de um novo socialismo científico.
Em conjunto com Friedrich Engels, Marx elaborou um modelo de explicação que via a economia como elemento determinante das estruturas políticas e sociais. Detectou a existência de classes com interesses antagônicos em constante conflito. Essa disputa pela primazia entre as classes seria responsável pelos movimentos e transformações ao longo do tempo. Em sua obra mais conhecida, “O Capital”, de 1867, Marx empregou esse prisma para desnudar os mecanismos de funcionamento do capitalismo, apontando a contradição entre capital e trabalho e concluindo com a previsão de que os proletários acabariam por conquistar espaço mediante a supressão da propriedade privada.
A partir desse conjunto de ideias Marx criou um programa de ação e procurou colocá-lo em prática através da doutrinação do proletariado. Essa é uma característica marcante desse pensador: sua atuação política real e direta. Marx participou de inúmeras assembleias e reuniões de operários e líderes sindicais, onde argumentava a favor de suas ideias, além de promover sua doutrina por meio da imprensa, sendo reconhecido em toda parte como uma força política pró-operariado, a ponto de ser preso em 1848 sob a acusação de incitar rebeliões. No entanto, recusou sistematicamente todos os convietes para participar de movimentos armados. Desejava a libertação “de dentro para fora”, uma insurreição baseada na compreensão, não na força.
No plano pessoal e familiar, tais opções ideológicas trouxeram infindáveis problemas e inúmeros dramas. Foi obrigado a se deslocar constantemente, fugindo de perseguições, até encontrar um porto seguro em Londres. Submeteu-se e aos seus a uma vida miserável, onde a fome, o desconforto material e as doenças eram companheiras habituais. Três de seus filhos morreram ainda na infância, em decorrência dessa vida atribulada e pobre.
Em seus últimos anos de vida, debilitado e cada vez menos ativo, Marx percebeu uma tendência que iria se acentuar após sua morte: o empobrecimento de suas ideias. Seus discípulos promoveram uma interpretação ruim de seu pensamento, resultando em escritos e ações economicistas, reducionistas e dogmáticas. O aviltamento era tão patente que o próprio Marx se declarava não marxista.
A França no século XIX: na vanguarda da revolução
Para Marx, a França era um interessante laboratório de provas para suas teorias, uma vez que era o núcleo dos movimentos sociais que convulsionavam a Europa, a vanguarda do desenrolar dos acontecimentos e palco de uma luta prolongada entre as forças da burguesia contra o proletariado. Ele empregou a metodologia do materialismo histórico para empreender uma explicação dos acontecimentos da França. Estudou as engrenagens e a dinâmica de seus sistema econômico e identificou uma coincidência entre as alterações dele e as convulsões políticas. Percebeu, por exemplo, que a aristocracia financeira foi beneficiada no governo de Luis Felipe e que a exclusão dos outros setores sociais fomentou a Revolução de 1848. Estabeleceu uma clara relação entre os movimentos econômicos com os sociais e políticos, inferindo o determinismo daqueles nestes. Essa análise da situação francesa foi retomada e ampliada mais tarde, quando Marx se dedicou a explicar a Comuna.
Resta apontar ainda que, à época da Comuna, Marx já havia publicado sua obra principal e que os acontecimentos de abril de 1871 pareciam confirmar as predições expostas nela. A partir da Inglaterra, ele acompanhou vivamente os eventos que se sucediam na Paris communard, e declarou de imediato o apoio da Internacional Comunista ao movimento.
Aspectos Formais do Texto
Essa é a essência do discurso de Marx presente em “O que é a Comuna?”: desvendar, em cada evento político, as forças sociais e econômicas que se beneficiam dele, ou que se prejudicam com ele, apontando o sentido dos esforços dos atores envolvidos.
Neste escrito, Marx dedica-se inicialmente a descrever a formação do Estado moderno, apresentando-o como uma construção burguesa que surgiu como instrumento de tomada e manutenção de poder, em sua luta contra a estrutura feudal. Uma vez apagados os sinais dessa forma arcaica de organização socio-econômica, o Estado burguês torna-se ferramenta de controle sobre as classes trabalhadoras pelo capital.
Dessa forma, demonstra que a burguesia francesa aperfeiçoou progressivamente seus mecanismos de coerção sobre o proletariado florescente e cada vez mais organizado. A revolução de 1830, vista por esse prisma, é mais do que a mera substituição de monarcas: a ascensão de Luis Felipe representa a troca de grupo dominante no poder, dos proprietários de terra pelos capitalistas
A sujeição das classes produtoras se acirra com a chegada de Napoleão III ao poder. A burguesia, superando momentaneamente as dissensões internas, concentra nesse personagem seus poderes, o que leva a uma centralização radical que acabou ferindo de morte o sistema parlamentar. Segundo Marx, esse foi o ápice do domínio burguês, momento em seus ganhos atingiram níveis “jamais sonhados por eles mesmos”. Sintomaticamente, foi um período de grande miséria para a massa trabalhadora.
O desastre dos projetos imperialistas delirantes do governo abriu espaço para que os parisienses realizassem uma forma de governo que repudiava não só o regime monárquico como também a própria dominação de classe. A Comuna representava, nessa análise, o modelo de governo ideal para as classes trabalhadoras. Uma vez senhores do governo, os representantes dos trabalhadores atacaram diretamente os maiores pilares de sustentação do Estado burguês: as forças policiais e militares, que perderam suas atribuições políticas, e a Igreja, destituída de seus bens e de sua influência sobre os destino espirituais. Os sistemas judiciário e escolar e a administração pública sofreram reformas que expurgaram os mecanismos benéficos às classes possuidoras. É esse o sentido que Marx confere às ações que a Comuna desempenhou nos pouco mais de dois meses em que permaneceu no controle de Paris.
Do meio da profusão de acontecimentos e da nuvem de interpretações e opiniões, Marx extraiu uma diretriz geral e se entusiasmou com experiência comunal e autogestionária corporificada em Paris. Tratou de defender, ponto por ponto, as ideias e ações da Comuna, apontando-a como elemento inédito na história política da Europa. Ele procurou demonstrar que a Comuna, longe de querer destruir o Estado, desejava universalizar o acesso a ele, retirando-o das mãos de um único segmento social. O mesmo afirma em relação à propriedade privada: o que se pretende é socializá-la, arrancando-a do controle de uns poucos privilegiados e colocando-a a serviço do bem comum.
Para Marx, a comuna é a materialização das ideias expostas em “O Capital”: o esgotamento do sistema capitalista, a assunção do “mandato histórico” de arautos de um novo tempo pelas classes trabalhadoras, que libertam com suas ações as novas forças. É ainda a demonstração empírica de sua noção de luta de classes como desencadeadora de dinâmicas e transformações.
A derrota da Comuna, canibalizada pelos asseclas do “anão monstruoso”, Monsieur Thiers, amparados por Bismarck, fez Marx repensar alguns de seus conceitos. Daí por diante, ele passou a defender a necessidade de um período de transição entre a derrubada do capitalismo e a construção do socialismo, um hiato a ser ocupado por uma “ditadura do proletariado” capaz de superar, com suas forças centralizadas, o caos que se desenvolve nos momentos de transformações profundas.
Considerações Finais
O século XIX testemunhou o zênite da economia capitalista ortodoxa. Depois de uma longa etapa de desenvolvimento e elaboração, as forças desse novo modelo de organização sócio-econômica se viram livres de suas amarras mercantilistas e finalmente puderam realizar aquilo que Adam Smith e seus seguidores preconizaram em suas obras: uma economia onde o mercado dava as cartas e ordenava, sem outras orientações senão a da auto-regulamentação, a vida produtiva das sociedades. O trabalho e a terra, até então protegidos da lógica de mercado, foram finalmente assimilados e transformados em mercadorias.
Esse fenômeno sem precedentes na história provocou efeitos contrários e radicais: por um lado, as forças econômicas atingiram um auge de poder, criando um mundo de realizações grandiosas e impensáveis num passado não muito distante. A capacidade de intervenção das forças humanas se tornou imensa e, por um momento, virtualmente infinita. Por outro lado, porém, a mercantilização do trabalho representou uma transformação brutal na vida dos indivíduos, um movimento que quase destruiu as sociedades. Os dois extremos foram atingidos: a riqueza mais elevada e a miséria mais absoluta.
O que impediu a destruição foi uma reação quase instintiva de repúdio aos novos modos de organização. Aos poucos, o nível de consciência sobre os mecanismos de funcionamento do capitalismo cresceu. O ápice dessa tomada de consciência veio em 1867, com a publicação de “O Capital”, obra que pôs a nu o novo sistema econômico e, ao mesmo tempo, ofereceu uma perspectiva de mudança revolucionária para as massas oprimidas. A Comuna de Paris representou, afinal, um dos momentos em que o sofrimento do povo se converteu em luta.
Referências Bibliográficas
KONDER, Leandro. Marx: Vida e Obra.
MARX, Karl. ”O que é a Comuna?” In: FERNANDES, F. (org.). Marx e Engels - História. Col. Grandes Cientistas Sociais n° 36. São Paulo: Ática, 1983.
O problema do lixo em Iguape e região: um olhar retrospectivo
Era 2006, o ano em que eu trocara São Paulo pela bucólica cidadezinha litorânea chamada Iguape. Nesse período eu havia iniciado uma jornada de reconstrução pessoal e profissional, proporcionada pelas ótimas condições do lugar: trabalhava numa escola onde tinha a possibilidade de realmente dar aulas e vivia numa cidade encravada num dos últimos remancescentes de Mata Atlântica, que me ofereceu um contato direto com a natureza: trilhas, praias, cachoeiras.
Mas novas preocupações apareceram, quando percebi a relação brutal que as pessoas de lá tinham com o meio ambiente. Isso me foi revelado no dia em que conheci o depósito de lixo da cidade vizinha, Ilha Comprida. Todos os resíduos da região eram despejados ali, às margens do rio Candapuí, sem qualquer lógica nem cuidados. Ao redor dos dejetos, além de ratos e urubus, viviam dezenas de pessoas que obtinham seu sustento rasgando com as mãos nuas as sacolas rejeitadas pelos moradores da cidade. Me interessei pelo problema do lixo, e fui buscar mais informações sobre o tema. Acabei descobrindo outras áreas de despejo de lixo, algumas clandestinas, algumas desativadas, e até um antigo lixão transformado em área de construção de casas populares, no bairro do Rocio. Registrei todas essas descobertas com minha singela câmera de 4 megapixels, montei com as imagens e informações coletadas algumas apresentações em Power Point, as quais exibi para algumas pessoas.
Dois anos depois, trabalhando numa escola privada da cidade, tive a oportunidade de retomar o projeto. Convidei um pequeno grupo de alunos para revisitar os locais de depósito de lixo, dessa vez munidos com uma câmera de vídeo. O objetivo era produzir material para realizar uma série de palestras de conscientização e tentar, ao final, levar o poder público municipal a tomar providências com relação ao problema. Aproveitamos o ano eleitoral para entrevistar os candidatos a prefeito inquirindo-os sobre suas propostas para o problema do lixão (e percebemos que, na verdade, a maioria não tinha nenhuma). Entrevistamos ainda os catadores, coletando seus relatos, ouvindo suas reclamações. Tínhamos, ao final, várias horas de imagens.
Mas os planos grandiosos que animaram os esforços de todos acabaram-se melancolicamente. Os vídeos editados foram exibidos apenas uma vez, na feira de ciências no final do ano. A audiência respondeu com indiferença. O ano acabou, cada um seguiu seu caminho e as ideias ficaram pegando poeira no fundo da gaveta...
Me lembrei disso porque hoje uma das alunas que participou daquilo me escreveu, contando que passou a tarde olhando o material que coletamos naquele ano de 2008 e que quer usa-lo para fazer alguma coisa... Esse contato inesperado deu início a um balanço daquele trabalho, uma reflexão que se concentrou nos motivos do fracasso relativo do processo todo. Avalio que o que nos desmotivou foi perceber, ao longo do estudo, que era uma luta perdida. Descobrimos que os órgão ambientais já haviam multado a prefeitura da Ilha diversas vezes por conta do problema do lixão, e que a atitude dos prefeitos frente a essas ameaças era a indiferença. Conversamos com os políticos que mostraram despreparo, ignorância, desconhecimento e uma clara atitude de não se comprometer
Analisando friamente hoje, a questão do lixão, assim como todos os outros problemas da região, é uma coisa que vai levar tempo pra ser resolvida, simplesmente porque não é prioridade para a sociedade. As pessoas da comunidade, que são a única força capaz de imprimir mudanças reais, não estão nem um pouco preocupadas com o destino do lixo.
Parecem pessimistas minhas conclusões, mas é a elas que chego hoje, alguns anos depois do acontecido...
Mas novas preocupações apareceram, quando percebi a relação brutal que as pessoas de lá tinham com o meio ambiente. Isso me foi revelado no dia em que conheci o depósito de lixo da cidade vizinha, Ilha Comprida. Todos os resíduos da região eram despejados ali, às margens do rio Candapuí, sem qualquer lógica nem cuidados. Ao redor dos dejetos, além de ratos e urubus, viviam dezenas de pessoas que obtinham seu sustento rasgando com as mãos nuas as sacolas rejeitadas pelos moradores da cidade. Me interessei pelo problema do lixo, e fui buscar mais informações sobre o tema. Acabei descobrindo outras áreas de despejo de lixo, algumas clandestinas, algumas desativadas, e até um antigo lixão transformado em área de construção de casas populares, no bairro do Rocio. Registrei todas essas descobertas com minha singela câmera de 4 megapixels, montei com as imagens e informações coletadas algumas apresentações em Power Point, as quais exibi para algumas pessoas.
Dois anos depois, trabalhando numa escola privada da cidade, tive a oportunidade de retomar o projeto. Convidei um pequeno grupo de alunos para revisitar os locais de depósito de lixo, dessa vez munidos com uma câmera de vídeo. O objetivo era produzir material para realizar uma série de palestras de conscientização e tentar, ao final, levar o poder público municipal a tomar providências com relação ao problema. Aproveitamos o ano eleitoral para entrevistar os candidatos a prefeito inquirindo-os sobre suas propostas para o problema do lixão (e percebemos que, na verdade, a maioria não tinha nenhuma). Entrevistamos ainda os catadores, coletando seus relatos, ouvindo suas reclamações. Tínhamos, ao final, várias horas de imagens.
Mas os planos grandiosos que animaram os esforços de todos acabaram-se melancolicamente. Os vídeos editados foram exibidos apenas uma vez, na feira de ciências no final do ano. A audiência respondeu com indiferença. O ano acabou, cada um seguiu seu caminho e as ideias ficaram pegando poeira no fundo da gaveta...
Me lembrei disso porque hoje uma das alunas que participou daquilo me escreveu, contando que passou a tarde olhando o material que coletamos naquele ano de 2008 e que quer usa-lo para fazer alguma coisa... Esse contato inesperado deu início a um balanço daquele trabalho, uma reflexão que se concentrou nos motivos do fracasso relativo do processo todo. Avalio que o que nos desmotivou foi perceber, ao longo do estudo, que era uma luta perdida. Descobrimos que os órgão ambientais já haviam multado a prefeitura da Ilha diversas vezes por conta do problema do lixão, e que a atitude dos prefeitos frente a essas ameaças era a indiferença. Conversamos com os políticos que mostraram despreparo, ignorância, desconhecimento e uma clara atitude de não se comprometer
Analisando friamente hoje, a questão do lixão, assim como todos os outros problemas da região, é uma coisa que vai levar tempo pra ser resolvida, simplesmente porque não é prioridade para a sociedade. As pessoas da comunidade, que são a única força capaz de imprimir mudanças reais, não estão nem um pouco preocupadas com o destino do lixo.
Parecem pessimistas minhas conclusões, mas é a elas que chego hoje, alguns anos depois do acontecido...
Fotos: acervo pessoal
quinta-feira, 13 de maio de 2010
Zumbizero
Esse texto é de um grande poeta-filósofo que observa, desde tempos imemoriais, do alto de suas torres como uma gárgula, a movimentação incongruente das pessoas que se movem, como formigas, e deixam trajetórias sempre tristes e irrefletidas. Já teve muitos nomes, mas hoje encarna a figura do Zumbizero. Direto das ruas de Araçatuba, a implacável escrita deste notável:
Ladeira
I
Pegue embalo na ladeira, vá perdendo altitude, caia na realidade, conheça a magnitude do abalo que embala as estruturas da cidade, onde o homem acordado sonha com a felicidade, e essa fantástica utopia vai comprando a prestação, de vida a caixa vazia ausente em presente ilusão a alma vendida ao diabo enquanto o corpo busca paz e imagina o horizonte com medo de olhar para trás.
Pegue embalo na ladeira, vá perdendo altitude, caia na realidade, conheça a magnitude do abalo que embala as estruturas da cidade, onde o homem acordado sonha com a felicidade, e essa fantástica utopia vai comprando a prestação, de vida a caixa vazia ausente em presente ilusão a alma vendida ao diabo enquanto o corpo busca paz e imagina o horizonte com medo de olhar para trás.
E alêm do mais, teu sonho alimenta a cidade, esse monstro que se cria ao devorar dignidade.
II
Por entre ruas sempre cheias de pessoas tão vazias, caminhando sós e alheias dentro de suas fantasias, fora da realidade submerge a multidão que persegue cega as rédeas da própria corrupção, entre o som do vozeirio desvairado e delirante que dilui o individuo numa massa dissonante que com pedras molda o mundo a primitivos ideais e arranha o céu com seus altares feitos de nobres metais.
Por entre ruas sempre cheias de pessoas tão vazias, caminhando sós e alheias dentro de suas fantasias, fora da realidade submerge a multidão que persegue cega as rédeas da própria corrupção, entre o som do vozeirio desvairado e delirante que dilui o individuo numa massa dissonante que com pedras molda o mundo a primitivos ideais e arranha o céu com seus altares feitos de nobres metais.
E alêm do mais, teu sonho alimenta a cidade, esse monstro que se cria ao devorar dignidade
III
E um grande circo então se arma em torno da sociedade e embriagando-se os sentidos patrocina-se a vontade do anuncio que propaga na armadilha cintilante as cores vivas do néon atraindo o destino errante, pelo atalho na corrida que organiza o vencedor, cada qual aposta a vida ou guarda em frascos seu suor, vendo o desejo com o tempo sem valor frente a razão mostrar-lhe o pescador de outrora preso a rede da ilusão.
E um grande circo então se arma em torno da sociedade e embriagando-se os sentidos patrocina-se a vontade do anuncio que propaga na armadilha cintilante as cores vivas do néon atraindo o destino errante, pelo atalho na corrida que organiza o vencedor, cada qual aposta a vida ou guarda em frascos seu suor, vendo o desejo com o tempo sem valor frente a razão mostrar-lhe o pescador de outrora preso a rede da ilusão.
Este texto, e outros do mesmo jaez, podem ser fruidos no blog original do Zumbizero:
sexta-feira, 7 de maio de 2010
domingo, 2 de maio de 2010
quinta-feira, 29 de abril de 2010
quarta-feira, 21 de abril de 2010
quarta-feira, 14 de abril de 2010
A day in the life
Às vezes me pergunto se não estou sendo muito pessimista, se não estou adotando uma atitude muito negativa, se não é por isso que vejo tantos problemas na escola e na educação. Pensava nisso ontem, a caminho do trabalho. O HTPC que tivemos antes das aulas reforçou esta impressão: coordenadores, diretores e colegas falavam de uma escola idílica. Fiquei confuso, porque essa não é a realidade que vejo no cotidiano de trabalho. Isso aprofundou em mim aquele medo de que seria eu o problema, dono de um olhar focado nas coisas ruins.
Mas a realidade do cotidiano resolveu esse dilema. Reproduzo abaixo as anotações que fiz em meu Diário de Classe, meu confidente e tábua de salvação, um instrumento do desespero, onde registro as crônicas da vida entre os muros da escola.
Mas a realidade do cotidiano resolveu esse dilema. Reproduzo abaixo as anotações que fiz em meu Diário de Classe, meu confidente e tábua de salvação, um instrumento do desespero, onde registro as crônicas da vida entre os muros da escola.
“Trabalhamos hoje o texto ‘Floresta abrigou primeiro milharal, diz estudo’. Não foi possível executar adequadamente a exposição oral que orientaria os trabalhos em função da recusa dos alunos em fazer silêncio. O nível de ruído oriundo da Avenida XXXXX também prejudicou o andamento da aula. Muitas janelas estão quebradas, e o pequeno alívio proporcionado pela refração do som pelos vidros não está presente hoje. A maçaneta da porta foi arrancada, o que obriga que se use uma tesoura para abri-la. Grupos numerosos de estudantes circulam o tempo todo pelos corredores, sendo necessário manter a porta fechada. A cada pequeno intervalo de tempo, alguém bate na porta. Ficar perto dela é perigoso: alguns a chutam com violência, arremessando-a contra quem estiver atrás.
O aluno XXXXXXX chegou com um atraso de 25 minutos, sendo impedido de assistir a primeira aula. Após ser admitido no segundo período, iniciou uma série de provocações e insultos a minha pessoa (citando textualmente: “está bravo? Então por que essa cara de bobo?”, “se está incomodado vai embora, cuzão”, entre outros). Procurei relevar inicialmente, e perguntei ao rapaz se havia algum problema, se havia motivo para essa atitude de enfentamento. No final da aula, após mais um insulto, perguntei a ele se havia esquecido de tomar seu medicamento, ao que me respondeu perguntando se eu já havia “chupado” hoje. Decidi que o limite tinha sido extrapolado: levei o aluno para a diretoria. No caminho, quase chorando, ele me pediu desculpas e quis se livrar da situação, alegando que a diretora ligaria para seu pai. Mantive a determinação e o levei para a diretoria”
Isto tudo aconteceu nas duas primeiras aulas. Mas havia mais coisa ainda por vir. Abaixo, o registro no Diário de Classe de uma outra aula:
“Conclusão da atividade com texto sobre o milho ancestral. No início da aula, quando tentava organizar a sala para começar os trabalhos, fui atingido no rosto por um fragmento de barra de chocolate [mais tarde vim a saber que se tratava de alimento fornecido pelo governo a título de ‘merenda escolar’]. Como não pude identificar o autor do arremesso, solicitei aos três alunos envolvidos na atividade de atirar o objeto fossem para a direção. Diante da recusa, fui obrigado a chamar a diretora para retirar os alunos da sala”.
Na volta pra casa, com um gosto de derrota na boca e um nó na garganta, tive o duvidoso prazer de perceber que minhas preocupações eram infundadas...
O pior é que querem que acreditemos que a culpa por esse caos na sala de aula é nossa, porque estamos adotando os métodos errados, porque somos antiquados e desinteressantes...
segunda-feira, 12 de abril de 2010
A qualidade do processo educacional pode ser medida em números?
Reportagem da Folha de São Paulo de hoje desmonta um esquema estelionatário que mostra bem como funciona o sistema educacional deste comecinho de século XXI no Brasil. Um "instituto" de Guarulhos envia para escolas do país todo uma carta parabenizando-as pela boa colocação nas avaliações de qualidade. Dizendo-se autorizados e mesmo apoiados pelo MEC e pelo Ministério da Educação, convidam a escola vitoriosa a participar de uma solenidade de entrega de certificado, e aí entra o golpe: para participar, basta pagar uma taxa de R$ 2.000,00, que pode ser parcelada em até 8 vezes.
Muitos donos de colégios e universidades caíram nesse golpe, e mais, obtiveram ganhos com isso. Uma diretora afirmou que sua escola, depois de premiada, recebeu 150 pedidos de matrícula a mais. E o pior é que muitas, quase todas, dessas escolas premiadas pelo instituto fajuto, eram na verdade mal colocadas nas avaliações e provas governamentais. Eram institutos de educação medíocres e fracassados. Mas a simples concessão de um prêmio, a simples comunicação de que uma avaliação externa indicou que ela superou os índices, serve de indicativo de sua qualidade, mesmo que o cotidiano não mostre isso, mesmo que os alunos que ali se formam sejam incapazes de realizar as tarefas mais básicas como ler, escrever e raciocinar corretamente.
É esse, afinal, o retrato das escolas de hoje. Todos os anos ficamos torcendo para que os índices apontem que melhoramos, e comemoramos quando isso acontece. Mas na prática, no dia a dia, é patente o fracasso, a decadência. Mesmo as escolas melhor avaliadas em qualquer desses certames questionáveis, sejam oficiais ou fajutos como o da reportagem, apresentam problemas sérios, profundos e que demorarão gerações para serem superados.
Essa política idiotizante das avaliações de qualidade só pode gerar isso que aí está: miragens que alimentam bobos e enriquecem raposas...
foto: http://www.jornalvicentino.com.br/home/wp-content/uploads/2008/10/SARESP1.jpg
Eis a reportagem sobre o golpe mencionado acima:
Golpe usa nome do MEC para premiar escola
Instituto de Guarulhos cobra R$ 2.000 para emitir certificado de qualidade que afirma ser baseado em índices oficiais
Anualmente, 150 escolas, supletivos e faculdades compram o direito de ser premiadas; ministro da Educação se disse perplexo
RICARDO GALLO DA REPORTAGEM LOCAL
Um instituto da Grande São Paulo vende, por R$ 2.000, um prêmio educacional baseado em um ranking inexistente do Ministério da Educação. Anualmente, 150 escolas, supletivos e faculdades compram desse instituto o direito de ser premiadas como as "melhores instituições de ensino do Brasil", à revelia do ministério.
Entre as premiadas, estão ao menos seis instituições de ensino superior reprovadas pelo MEC, além de colégios sem expressão e/ou mal colocados no Enem -exame que avalia o ensino médio. Elas propagandeiam o prêmio como se fosse oficial e disseram não saber que não era do MEC.
Não há ranking nacional que junte escolas e universidades -elas são avaliadas por exames diferentes.O ministério pedirá que a Polícia Federal investigue o caso e tomará as "providências judiciais cabíveis". Por meio da assessoria de imprensa, o ministro Fernando Haddad se disse perplexo. O MEC afirmou que fará campanha para divulgar em todo o Brasil índices oficiais, de modo a evitar o uso indevido de dados federais.
O Prêmio Nacional de Excelência em Qualidade no Ensino existe desde 2005, promovido pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa de Qualidade Gomes Pimentel, de Guarulhos.
Receberam o título de melhores do país escolas como o Qui-Mimo, de Guanambi (BA), o Jardim Escola Vovô Lima, de São Pedro da Aldeia (RJ), e o supletivo Supla, de Timbó (SC), além dos centros universitários Unieuro (DF) e Unibahia (BA).
A premiação foi em novembro, em um bufê no Tatuapé (zona leste de SP). Quem paga pelo prêmio tem direito a jantar, DVD, troféu e um certificado com brasão da República e o logotipo do governo federal ("Brasil, um país de todos").
Além de usar indevidamente o nome do ministro, o instituto colocou em seu site uma foto de Haddad como se ele estivesse presente em uma das edições do prêmio. Trata-se, na realidade, de imagem retirada do Google, de uma entrevista do ministro dada à TV UFMG.
Abordagem
É o Gomes Pimentel que procura as instituições para oferecer o prêmio, segundo relato de quatro "vencedores" à Folha. Primeiro, envia uma carta em que aponta o destinatário como potencial homenageado. São cinco critérios, quatro deles vagos: filosofia educacional, prática operacional, respeito ao aluno, responsabilidade social e qualidade de ensino.
Apenas o último item é medido pelo MEC, embora o instituto assegure se basear em dados oficiais. Em seguida, vem a cobrança dos R$ 2.000, que podem ser parcelados em até oito vezes. O instituto chama o pagamento de "adesão" e diz aos 150 premiados que o dinheiro corresponde aos custos do evento. O informativo, a que a Folha teve acesso, é claro: só recebe o troféu e o certificado de qualidade quem estiver na "solenidade".
A negociação pode, em alguns casos, resultar em desconto. A Folha falou com uma instituição que disse ter pago R$ 1.700. Nos últimos dois anos, a relação de instituições "vencedoras" aumentou -em 2007, eram 120. A edição de 2010, marcada para 29 de novembro, já tem 18 instituições homenageadas, informa o site do instituto.
Fonte: Jornal Folha de São Paulo, dia 12 de abril de 2010, caderno Cotidiano.
Entre as premiadas, estão ao menos seis instituições de ensino superior reprovadas pelo MEC, além de colégios sem expressão e/ou mal colocados no Enem -exame que avalia o ensino médio. Elas propagandeiam o prêmio como se fosse oficial e disseram não saber que não era do MEC.
Não há ranking nacional que junte escolas e universidades -elas são avaliadas por exames diferentes.O ministério pedirá que a Polícia Federal investigue o caso e tomará as "providências judiciais cabíveis". Por meio da assessoria de imprensa, o ministro Fernando Haddad se disse perplexo. O MEC afirmou que fará campanha para divulgar em todo o Brasil índices oficiais, de modo a evitar o uso indevido de dados federais.
O Prêmio Nacional de Excelência em Qualidade no Ensino existe desde 2005, promovido pelo Instituto Brasileiro de Pesquisa de Qualidade Gomes Pimentel, de Guarulhos.
Receberam o título de melhores do país escolas como o Qui-Mimo, de Guanambi (BA), o Jardim Escola Vovô Lima, de São Pedro da Aldeia (RJ), e o supletivo Supla, de Timbó (SC), além dos centros universitários Unieuro (DF) e Unibahia (BA).
A premiação foi em novembro, em um bufê no Tatuapé (zona leste de SP). Quem paga pelo prêmio tem direito a jantar, DVD, troféu e um certificado com brasão da República e o logotipo do governo federal ("Brasil, um país de todos").
Além de usar indevidamente o nome do ministro, o instituto colocou em seu site uma foto de Haddad como se ele estivesse presente em uma das edições do prêmio. Trata-se, na realidade, de imagem retirada do Google, de uma entrevista do ministro dada à TV UFMG.
Abordagem
É o Gomes Pimentel que procura as instituições para oferecer o prêmio, segundo relato de quatro "vencedores" à Folha. Primeiro, envia uma carta em que aponta o destinatário como potencial homenageado. São cinco critérios, quatro deles vagos: filosofia educacional, prática operacional, respeito ao aluno, responsabilidade social e qualidade de ensino.
Apenas o último item é medido pelo MEC, embora o instituto assegure se basear em dados oficiais. Em seguida, vem a cobrança dos R$ 2.000, que podem ser parcelados em até oito vezes. O instituto chama o pagamento de "adesão" e diz aos 150 premiados que o dinheiro corresponde aos custos do evento. O informativo, a que a Folha teve acesso, é claro: só recebe o troféu e o certificado de qualidade quem estiver na "solenidade".
A negociação pode, em alguns casos, resultar em desconto. A Folha falou com uma instituição que disse ter pago R$ 1.700. Nos últimos dois anos, a relação de instituições "vencedoras" aumentou -em 2007, eram 120. A edição de 2010, marcada para 29 de novembro, já tem 18 instituições homenageadas, informa o site do instituto.
Fonte: Jornal Folha de São Paulo, dia 12 de abril de 2010, caderno Cotidiano.